17 fevereiro 2012
Autor: Cesar Vidal
Fonte: http://conoze.com
Tradução: Carlos Martins Nabeto
Fonte: http://conoze.com
Tradução: Carlos Martins Nabeto
bibliacatolica - Durante
décadas, vários historiadores, especialmente os de orientação marxista,
insistiram em apresentar as Cruzadas como um fruto resultante
exclusivamente de fatores materiais.
Apenas a cobiça e o desejo de
obter terras teriam levado os cruzados a abandonar a Europa ocidental e
a dirigir-se para a Terra Santa; porém, apesar da comum aceitação desta
ideia, teriam sido as Cruzadas fruto de um simples interesse material?
A
historiografia marxista e aquela que sem sê-lo é influenciada por esta
têm insistido por décadas no caráter meramente material das Cruzadas.
Neste sentido, por exemplo, a “História das Cruzadas”, de Mijail
Zaborov, declara que os cruzados apenas se moveram para o Oriente
Próximo nutridos pelo desejo de obter benefícios econômicos que,
essencialmente, se traduziriam na posse de terras e no aumento do
bem-estar material. Em outras palavras, a Cruzada não passava de uma
emigração violenta, movida por causas meramente crematísticas. O
elemento espiritual apenas proporcionava a cobertura, bastante ridícula
de outra parte, para semelhante aventura de saque e pilhagem.
O
ponto de vista de Zaborov, tão repetido posteriormente, resultava
especialmente sugestivo à medida em que permitia desacreditar um
empreendimento de caráter confessadamente espiritual e, por sua vez,
dava um exemplo de como este tipo de fenômeno podia ser explicado
recorrendo-se apenas para argumentos economicistas. No entanto, como
tantas explicações desta natureza, apesar de sua formulação bem cuidada e
instrumental, não resiste a uma análise minimamente sólida da
documentação com que contamos. Em primeiro lugar, o que se depreende das
fontes da época é que marchar à cruzada não implicava um incentivo
econômico, mas sim em um enorme sacrifício monetário que alguém somente
poderia empreender se estivesse convencido de que a recompensa seria
mais sólida do que um pedaço de terra ou uma bolsa de moedas. A respeito
disso, os documentos não poderiam ser mais claros. Um cavaleiro alemão
que fosse convocado a servir ao imperador naqueles anos em um lugar tão
próximo da Alemanha, gastava, tão somente na viagem e em vestimentas, o
equivalente a dois anos de seu soldo; para um francês viajar para a
Terra Santa, implicava gastos que chegava a quintuplicar suas rendas
anuais. Portanto, como primeira medida, precisavam endividarem-se
bastante para acudir à cruzada. Em não poucos casos, inclusive, perderam
tudo o que tinham para juntarem-se ao empreendimento.
Não deixa
de ser curioso que Henrique IV da Alemanha, em uma carta, se refira a
Godofredo de Bulhão e Balduíno de Bolonha – ambos caudilhos da Primeira
Cruzada – como pessoas que são “seguras pela esperança de uma
herança eterna e, por amor, se prepararam para ir lutar por Deus em
Jerusalém, tendo vendido e deixado [para trás] todas as suas posses”.
Desde logo, este caso não foi exceção. De fato, o Papa e os bispos
reunidos no Concílio de Clermont redigiram uma lei que impunha a pena de
excomunhão àqueles que se aproveitassem dessas circunstâncias para
despojar os cavaleiros cruzados de suas propriedades, valendo-se de
práticas usurárias ou hipotecas elevadas. A relação de cavaleiros que se
endividaram extraordinariamente para atender, por exemplo, à Primeira
Cruzada é enorme e demonstra que essa era a tendência geral.
Tampouco
faltaram os apoios eclesiais em termos econômicos. Por exemplo: o bispo
de Lieja obteve fundos para auxiliar o arruinado Godofredo de Bulhões
despojando os relicários de sua catedral e arrancando as joias das
igrejas de sua diocese. Talvez se pudesse interpretar tudo isto como uma
inversão arriscada – e como! -, que seria compensada com as terras que
os cruzados conquistaram no Oriente. No entanto, essa análise tampouco
resiste à confrontação com os documentos. É certo que durante a Primeira
Cruzada um número notavelmente pequeno de cavaleiros optou por
permanecer nas terras arrebatadas dos muçulmanos. Não obstante, salvo
estas exceções, a imensa maioria dos cruzados retornaram à Europa. Após
ocorrer, no curso da Primeira Cruzada, a tomada de Jerusalém e a vitória
sobre um exército egípcio (em 12 de agosto de 1099), praticamente a
totalidade retornou às suas origens sem bens e com dívidas; porém, ao
que parece, com um profundo sentimento de orgulho pela façanha que
haviam realizado. De fato, para defender os Santos Lugares, restou
necessário articular a existência de ordens militares como os Cavaleiros
Hospitalários, primeiramente, e dos Templários posteriormente. E a
situação econômica nas Cruzadas seguintes não foi melhor…
Novamente
o fator espiritual foi decisivo e, precisamente, para custear os
enormes gastos de um empreendimento que recaía sobre os peregrinos,
assim se consideravam seus participantes, já que o termo “cruzado” é
posterior. Os monarcas recorreram a impostos especiais ou a empréstimos
concedidos à Coroa. Uma vez após outra, a possibilidade de permanecer na
Terra Santa – se é que alguém a contemplava – revelou-se impossível,
porém isso não desanimou os participantes seguintes no decorrer de dois
séculos. Certamente, não podemos ter uma imagem excessivamente ideal das
Cruzadas e tampouco podemos negar que seu modelo de espiritualidade em
muitas ocasiões causa mais calafrios em nossa sensibilidade
contemporânea do que entusiasmo. Apesar de tudo, existe um dado que não
se pode negar, até porque aparece corroborado em milhares de documentos:
Desconsiderando
a maior ou a menor categoria humana e espiritual dos participantes, seu
impulso era fundamentalmente espiritual. Movidos pelo desejo de
garantir o livre acesso dos peregrinos aos Lugares Santos e de alcançar o
céu, abandonaram tudo o que tinham e se lançaram a uma aventura em que
não poucos não apenas se arruinaram como também acabaram por encontrar a
morte. Um exemplo – diga-se de passagem – que não dissuadiu outros de fazer o mesmo ao longo de dois séculos!
Não se tratou, portanto, de um movimento material disfarçado de
espiritualidade, mas de um colossal impulso de raízes espirituais que
não encontrou inconveniente – apesar de seus enormes defeitos – de
enfrentar consideráveis riscos e perdas materiais.
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