segunda-feira, 1 de setembro de 2014

As palavras duras e ausentes do Papa aos bispos coreanos

ihu - No primeiro dia da visita do Papa Francisco à Coreia do Sul ele se encontrou com os bispos coreanos. Na ocasião, o pontífice disse a eles para serem um com os pobres.
No entanto, alguns de seus mais fortes conselhos não foram trazidos ao grande público na época, pois vários parágrafos de sua fala foram tirados do texto oficial distribuído à mídia.
A reportagem é de Thomas C. Fox, publicada pelo National Catholic Reporter, 28-08-2014. A tradução é de Isaque Gomes Correa.
Os bispos coreanos lançaram um sítio – “Visita Pastoral 2014 do Papa Francisco à Coreia” – para as centenas de meios de comunicação, locais e estrangeiros, que trabalhavam na cobertura da viagem de cinco dias do papa pela Coreia do Sul. O sítio fornecia os textos oficiais e fotos de todos os eventos.
Na esteira da visita, vários jornalistas coreanos perceberam as discrepâncias entre as falas do papa em relação aos textos disponibilizados no sítio do Vaticano e os textos presentes em sítios disponíveis para os meios de comunicação, entre eles o da Conferência dos Bispos Católicos da Coreia.
Quando alguns jornalistas pediram uma explicação sobre estas discrepâncias, um porta-voz dos bispos coreanos disse que os parágrafos foram retirados inadvertidamente. Os parágrafos em falta foram, agora, acrescentados no sitio dos bispos coreanos.
Como dito acima, Francisco disse aos bispos coreanos que “a solidariedade com os pobres está no coração do Evangelho”, e que “ela deve penetrar os corações e mentes dos fiéis e se refletir em todos os aspectos da vida eclesial (...). Rezo para que esse ideal continue a moldar o caminho da Igreja coreana na sua peregrinação para o futuro”.
O que ele disse a seguir, no entanto, não foi informado porque tinha sido deixado de fora do texto disponibilizado para a mídia.
Francisco falou especificamente sobre as dificuldades que uma igreja local pode ter ao viver na prosperidade, alertando os bispos para não serem uma Igreja de “classe média”, que perde a sua missão evangélica radical e, mesmo, se torna um embaraço para os pobres.
Ele disse:
“Tenho dito que os pobres estão no coração do Evangelho; eles estão presentes aí do começo ao fim. Na sinagoga de Nazaré, Jesus deixou isso bem claro desde o início do seu ministério. E quando em Mateus 25 ele fala dos últimos dias e revela os critérios pelos quais todos seremos julgados, aí também encontramos os pobres. Há um perigo, uma tentação que surge nos tempos de prosperidade: é o perigo de que a comunidade cristã se torne apenas mais uma ‘parte da sociedade’, perdendo a sua dimensão mística, perdendo a sua capacidade de celebrar o Mistério e se tornando uma organização espiritual, cristã e com valores cristãos, mas sem o fermento da profecia. Quando isso acontece, os pobres não mais têm o seu papel próprio na Igreja. É uma tentação da qual certas igrejas, comunidades cristãs, vêm sofrendo ao longo dos séculos; nalguns casos elas se tornam tão classe média que os pobres até mesmo se sentem envergonhados em ser parte deles. É a tentação da ‘prosperidade’ espiritual, prosperidade pastoral. Ela não mais é uma Igreja pobre para os pobres, mas sim uma Igreja rica para os ricos, ou uma Igreja classe média para os acomodados. Também nada disso é novidade: a tentação estava aí desde o início. Paulo precisou repreender os coríntios em sua Primeira Carta (11,17), enquanto o apóstolo Tiago foi ainda mais severo e explícito (2,1-7): ele precisou repreender as comunidades ricas, igrejas ricas para pessoas ricas. Elas não estavam expulsando os pobres, mas a forma como estavam vivendo deixava os pobres relutantes a entrar, estes não se sentiam em casa. Esta é a tentação da prosperidade.

Não estou admoestando vocês, pois sei que estão fazendo um bom trabalho. Como um irmão, no entanto, que tem o dever de confirmar os irmãos na fé, lhes digo: tenham cuidado, porque a Igreja local de vocês está prosperando, é uma grande igreja missionária, uma grande igreja. Não devemos permitir que o diabo lance estas sementes, esta tentação de tirar os pobres da estrutura profética desta igreja e torná-la uma igreja rica para os ricos, uma igreja para os acomodados – talvez não ao ponto de desenvolver uma ‘teologia da prosperidade’ –, mas uma igreja da mediocridade”.
Também deixado de fora de uma fala do papa aos bispos coreanos estava um conselho que deu para estes continuarem próximos de seus padres. Nesse sentido, ele foi específico: “Meus irmãos, se um padre telefonar para vocês hoje e pedir para vê-los, chame-o imediatamente, hoje mesmo ou amanhã”.
Estas eram as palavras que não tinham sido passadas à mídia e que não apareciam, originalmente, no sítio da Conferência dos Bispos:
“Peço a vocês para ficarem próximos de seus padres. Próximos, de forma que eles possam vê-los frequentemente. Esta proximidade do bispo não é apenas fraternal, mas também paternal: enquanto levam adiante o ministério pastoral, eles precisam disso. Os bispos não devem ficar distantes de seus padres, ou pior: inacessíveis. Digo isso com um coração pesado. De onde eu venho, alguns padres dizem: ‘Telefonei para o bispo, pedi para me encontrar com ele; no entanto, já se passaram três meses e ainda não recebi uma resposta’. Meus irmãos, se um padre telefonar para vocês hoje e pedir para vê-los, chame-o imediatamente, hoje mesmo ou amanhã. Se não tiverem tempo para vê-lo, diga: ‘Eu não posso me encontrar com você por causa disso e daquilo, mas quis telefonar para você e aqui estou para falarmos’. Deixem-nos ouvir a resposta do pai, o mais rápido possível. Por favor, não se distanciem de seus padres.”

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...