08/12/20143
Autor: Pe. Juan Carlos Sack
Fonte: http://www.apologetica.org
Tradução: Carlos Martins Nabeto
Fonte: http://www.apologetica.org
Tradução: Carlos Martins Nabeto
Os “primeiros cristãos”, os “reformadores protestantes” e os “modernos evangélicos” diante das palavras de Jesus sobre a Eucaristia…
- “O Corpo e o Sangue do Senhor deveriam experimentar um contínuo aumento de massa à medida que, por tantos séculos, todos os dias, se tem ‘transubstanciado’ pão e vinho” (Jetônio, evangélico).
- “Quanto ao fato de [o Corpo de Cristo] estar em um lugar [ou vários ao mesmo tempo, nas hóstias consagradas], já vos disse antes e vos intimo: não quero nada de matemáticas!” (Martinho Lutero).
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem por finalidade aproximar o leitor de fala
portuguesa dos textos patrísticos mais importantes, bem como dos textos
de outros escritores eclesiásticos antigos, sobre o modo da presença de
Jesus Cristo na Eucaristia (real, simbólico, virtual, dinâmico etc.).
Foram acrescentados também os textos de alguns “reformadores” do século
XVI.
Os textos de alguns “modernos evangélicos” são aqui expostos para
compará-los com o pensamento da Igreja do primeiro milênio e com o
pensamento dos “reformadores” protestantes.
Neste artigo não tratamos diretamente dos textos bíblicos sobre a
Eucaristia. Para estes, remetemos aos artigos publicados em outros
pontos deste Site. (…)
O que motivou este trabalho foi o surgimento na Internet de artigos
que não apenas negam a realidade da presença de Jesus Cristo na
Eucaristia, como também se atrevem a ironizá-la. Neste artigo esses
autores – e também os nossos leitores – descobrirão se as suas palavras e
doutrinas se assemelham àquelas dos antigos cristãos e até mesmo dos
hereges de todos os tempos. É importante perceber nitidamente que a
Igreja [Católica] não nasceu ontem; esquecer a História da Igreja é
negar, na prática, a ação do Espírito Santo nestes últimos 2000 anos.
Com efeito, visto que estes “cristãos evangélicos” se aproximam das
Escrituras “sem a mediação de tradições humanas” – segundo nos afirmam
com notável insistência – o resultado inevitável é que cada geração de
“evangélicos” deve recomeçar sua interpretação das Escrituras, como se
eles fossem os primeiros a descobrir as dificuldades apresentadas pela
Revelação e o texto bíblico, ou como se fossem os únicos capazes de
interpretar as Escrituras “mediante uma exegese adequada”. Deste modo,
obtém-se uma situação que, em qualquer outra área do saber humano, se
tornaria a maior das negligências, isto é: os problemas, questões e
soluções que foram feitos e fixados sobre o Evangelho no decorrer dos
séculos tornam a ser tratados como se nunca ninguém os tivessem
considerado antes[1].
Sobre a doutrina eucarística, os exemplos são numerosos. O discurso
de Jesus em João 6, as palavras de instituição nos Sinóticos e nos
testemunhos de Paulo, cuja misteriosa realidade impactou a Igreja de
Deus desde sempre e provocou tanta aversão entre os inimigos da Igreja,
são agora tratados pelos modernos opositores do mistério eucarístico
como nunca ninguém tivesse lido as Escrituras antes deles. E querem
desde logo que a Igreja, ou pelo menos os católicos menos instruídos,
aceitem essas novas interpretações, que depois certamente terão que
abandonar para aceitar as próximas novidades interpretativas do
“evangélico” seguinte que decida estudar os textos bíblicos como se
fosse o primeiro a concluir e se convencer de que a sua interpretação é a
autêntica “exegese adequada”[2].
Diante desta realidade, pareceu-me oportuno apresentar ao leitor o
que outras pessoas pensaram e ensinaram acerca da Eucaristia, pessoas
estas que conheciam as Escrituras muito melhor que qualquer um destes
“evangélicos”, e que foram tidos em vida – e também depois de falecidos –
como autênticos discípulos de Cristo, estando muito mais próximos da
Igreja Apostólica e possuindo o Espírito Santo tanto ou até mais que
qualquer um dos que hoje se apresentam quase que como Sua atual
personificação.
Citarei em primeiro lugar algumas expressões que o leitor pode
encontrar nesses sites “evangélicos” e, a seguir, proporei os textos
patrísticos e dos “reformadores” do século XVI: a contraposição de
textos falará por si mesma. Apresentarei também os textos patrísticos
que são extraídos desses Sites “evangélicos” como “simbólicos”, por
serem lidos fora do contexto e sem o conhecimento das circunstâncias.
OS “CRISTÃOS EVANGÉLICOS”
Usarei textos do Site “evangélico” Conoceréis la Verdade, pertencente
à denominação cristã evangélica batista. Há na Internet (…) outros
artigos anti-eucarísticos, mas este Site batista apresenta as objeções
mais comuns neste sentido. Aí é possível encontrar as seguintes
doutrinas sobre a Eucaristia:
- “O Cristianismo evangélico afirma que [a Eucaristia] é apenas uma
comemoração do momento em que Jesus representa o sentido de Seu
sacrifício expiatório aos Seus discípulos. Por consequência, por ser uma
‘recordação’, o resultado é que o pão continua sendo pão e o vinho
continua sendo vinho”[3].
- “E o comer Seu corpo físico seria canibalismo, um ato que Ele não aprovaria e muito menos recomendaria”[4].
Comentando as palavras de Jesus na Última Ceia, diz também:
- “Ninguém poderia ter interpretado literalmente essa declaração,
pois Ele estava ali sentado, em seu corpo físico, e sujeitando o pão em
suas mãos. É óbvio que o pão era simbólico”.
E ainda:
- “Podemos estar seguros de que nenhum dos discípulos de Cristo
imaginou que o pão por Ele sustentado era Seu corpo literal. Que isto
fosse o Seu corpo literal e, ao mesmo tempo, Cristo estar ali em seu
corpo literal era impossível. Tal fantasia não ingressou na mente dos
presentes e não foi inventada a não ser muito tempo depois. Certamente
as palavras de Cristo não comunicaram tal coisa, nem temos qualquer
razão para crer que os discípulos derivaram delas semelhante
significado. Foi o Papa Pio III quem fez do ‘sacrifício’ da Missa um
dogma oficial em 1215″[5].
Se lê também nesse Site expressões ofensivas e descaradas, como uma
que afirma que a Eucaristia, como presença real de Jesus Cristo, seria
parte de um “truque” para manter os católicos na Igreja, visto que fora
da Igreja – conforme ensina a doutrina católica – não há celebração
eucarística válida e, portanto, não há jeito de se receber o Corpo
salvífico do Senhor a não ser participando das celebrações católicas: “O
truque está aí”, conclui o apologista batista.
Assim, ou seja, pela doutrina eucarística, “o Catolicismo está
separado, por um abismo intransponível, de todas as outras religiões e,
especialmente, do Cristianismo evangélico”.
Em um artigo sobre a Ceia do Senhor assinado por Guillermo Hernández
Agüero, publicado no Site “Conoceréis la Verdad”, se faz uma fugaz
referência ao que “alguns Padres patrísticos” ensinam acerca do pão
eucarístico. Não me causa espanto a magra apresentação “patrística” que
ali se faz: uma das notas características do evangelismo fundamentalista
é precisamente a atitude sectária de rejeitar na prática – e
frequentemente também na teoria – a experiência e o pensamento dos
cristãos, mártires e santos, pastores e simples fiéis que viveram antes
de nós, sem excluir aquelas que são testemunhas valiosas da Igreja
Apostólica e Pós-Apostólica.
Digo “magra apresentação patrística” porque esse artigo traz só 2
(duas) citações dos “Padres patrísticos” para ilustrar aos
(desprevenidos) leitores do Site batista:
- “Podemos nos aprofundar mais nos Padres, mas nosso tema neste caso é
sobre a Santa Ceia[6]. No entanto, há alguns Padres que podem nos dizer
algo sobre o nosso tema[7]: ‘Cristo, tendo tomado o pão e o tendo
distribuído aos seus discípulos, o tornou seu corpo, dizendo: «Este é
meu corpo», isto é, «a figura do meu corpo»’ (Tertuliano, Contra Marcião
4:40). Tertuliano nos dá a entender que não ocorre uma
transubstanciação com o pão; ao contrário, nos ensina que isso é
símbolo. ‘O pão, depois da consagração, é digno de ser chamado «Corpo do
Senhor», ainda que a natureza de pão permaneça nele’ (Crisóstomo,
Epístola a Cesarium)[8]. O interessante disto tudo, é que nem nos
próprios Padres existe uma clareza sobre a Santa Ceia e menos ainda
sobre a transubstanciação”.
Estas duas citações de dois Padres é todo o material patrístico que
pode ser encontrado nos artigos “eucarísticos” do Site “Conoceréis la
Verdad”. O leitor entenderá o porquê quando terminar de ler a presente
[série de] artigo[s].
Hernández Agüero, depois de tentar desvirtuar o testemunho geral dos
Padres (para que prevaleça o seu próprio testemunho, como é óbvio, e que
ele afirmará ser “o que ensina a Bíblia”), pretende que seus leitores
saibam “algo” do que “alguns Padres podem nos dizer acerca do nosso
tema”, mas suas duas citações dificilmente podem ser tidas seriamente
como “algo”, bem como seus dois Padres apenas podem cumprir o requisito
mínimo para que se possa dizer “alguns Padres”.
Pergunto então: pela mente destes “evangélicos”, o que terá ocorrido
com o mar de citações onde podemos ver os “Padres patrísticos” ensinarem
a doutrina da presença real? Não conhecem elas? Não querem conhecê-las?
Não interessa para eles mostrar o que a Igreja pensava nos primeiros
séculos? Pois se eles conhecem essas citações, estaríamos diante de uma
desonestidade intelectual bastante grosseira. Mas, se pelo contrário,
não as conhecem, por que falam do que não sabem, dando aos seus leitores
uma visão totalmente falsa da realidade patrística? Bem além do
palavreado de Hernández Agüero, em seu artigo o leitor não poderá
encontrar virtualmente nada do que os “Padres patrísticos” ensinaram
sobre esta matéria. Seja qual for a intenção desta indouta docência
“evangélica”, a abandonamos ao juízo de Deus…
A seguir, percorrermos a História da Igreja em seus melhores
expoentes – os Santos Padres, os grandes escritores e testemunhas da Fé
antiga – de modo que o leitor poderá depois reconhecer qual é a doutrina
que está separada “por um abismo intransponível” do que a Igreja
ininterruptamente crê desde as suas origens[9]. Apresentaremos também o
que os Pais do Protestantismo ensinavam acerca desse tema. E para o
benefício do leitor, acrescentaremos ainda uma breve resenha biográfica
dos autores citados, que será mais detalhada naqueles mais antigos e
mais resumida à medida que formos avançando nos séculos.
NOTAS:
[0] Trabalho dedicado a Silvana, Adrián, Carlos e Pablo, José Luis e
Claudio, que ou já regressaram ao lar (=a Igreja Católica), ou então já
estão a caminho… Perseverança! OBS.: [A] Os comentários que aqui são
feitos têm por finalidade esclarecer o contexto histórico das citações
ou ressaltar algum aspecto importante. As citações bíblicas que aparecem
nos textos entre colchetes ou parêntesis são sempre acréscimos; o que
segue entre colchetes nos textos patrísticos ou de outros autores são
acréscimos feitos para se compreender o contexto. [B] O artigo
[completo] contém textos de 80 autores patrísticos e ainda alguns
outros. (…)
[1] Devemos, no entanto, matizar esta afirmação, já que na verdade
ninguém consegue se libertar de toda espécie de tradição na hora de ler
as Escrituras, de modo que até os “evangélicos” “mais bíblicos”
receberam, juntamente com as Escrituras, uma certa chave de
interpretação. Tendo deixado isto bem claro, também é correto o que
afirmamos, a saber: as correntes “evangélicas” fundamentalistas
pretendem fazer uma leitura das Escrituras ignorando tudo o que os
outros cristãos antes deles pensaram sobre as mesmas; costumam a chamar
isso de “leitura sem preconceitos”.
[2] A expressão “exegese adequada” aplicada aos textos eucarísticos
encontra-se pelo menos no Site “Conoceréis la Verdad”, onde se afirma,
no artigo “A Teoria da Transubstanciação”, que o crente deveria rejeitar
a interpretação da Igreja Católica baseado no “senso comum” e numa
“exegese adequada”. Resta averiguar com base em quê se poderia chamar
“adequada” a exegese desse Site e “não adequada” ou “falta de senso
comum” à exegese de Justino [de Roma] e Inácio de Antioquia (séculos I e
II), ou a de Agostinho [de Hipona] e João Crisóstomo (séculos IV e V),
ou a de Tomás de Aquinho (século XIII), para mencionar apenas alguns.
[3] O autor dessas linhas se apresenta tacitamente como o portavoz do
Cristianismo evangélico… Pode então ser comparado, por exemplo, com o
que Lutero pensava sobre este tema (ver mais adiante, nesta série de
artigos).
[4] As acusações de canibalismo, repetidas aqui pelo “evangélico”
batista, não são senão repetição das mesmas acusações feitas pelos
pagãos anticristãos dos dois primeiros séculos. Uma coincidência que não
deixa de causar surpresa!
[5] A presença real de Cristo na Eucaristia e o aspecto sacrificial
da celebração, ainda que intimamente ligadas, são dois aspectos
diferentes do mistério eucarístico, que o autor batista aqui confunde.
Quão errônea é a afirmação segundo a qual a interpretação realista das
palavras da Última Ceia são tão tardias quanto o século XIII poder-se-á
comprovar ao longo [desta série de artigos]. Além disso, o que é de 1215
(ou mais exatamente 1202) é o surgimento da palavra “transubstanciação”
em um documento da Igreja. E, finalmente, o Papa Pio III reinou em 1503
e não em 1215. Logo, o Papa em questão é, na verdade, Inocêncio III.
[6] O que até aqui Hernández Agüere fez em seu artigo não foi
“aprofundar” nos Padres, mas tentar desautorizá-los por suas supostas
“contradições”.
[7] Há “alguns Padres que podem nos dizer algo sobre o nosso tema” –
diz Hernández, citando [só] DOIS Padres. Espero que após ler este
artigo, o sr. Hernández Agüero possa encontrar mais alguns que possam
nos “dizer algo” sobre o nosso tema.
[8] Retornaremos a estas citações de Tertuliano posteriormente.
[9] Uma coleção mais ampla de textos em espanhol encontramos em “A
Presença Real de Cristo na Eucaristia”, de José A. de Aldama, Edicep,
Valência, 1993; empregarei este livro em muitas citações. [Em inglês,
temos] também “The Faith of the Early Fathers”, em 3 volumes, de William
A. Jurgens. A melhor coleção em espanhol é, sem dúvida, “Textos
Eucarísticos Primitivos”, do Pe. Jesús Solano (sj), em 2 volumes. Uma
coleção mais simples, porém com muitíssimo material apologético, temos
em “Bíblia y Eucaristia”, de Ernesto Bravo (sj). O fato totalmente
indiscutível é que qualquer cristão que queira saber o que ensinaram
antes de nós todos os melhores líderes do Cristianismo primitivo acerca
da presença de Cristo na Eucaristia terá que recorrer à literatura
católica. Por que será?
Nenhum comentário:
Postar um comentário