[unisinos]
"Talvez os métodos estavam equivocados. Mas a Igreja não era
modelo a ser imitado: havia corrupção, mundanidade, lutas de poder. Ele [Lutero] contestou. E deu um passo à frente para criticá-la. Depois, viu que não estava mais sozinho." Essas são as palavras que o Papa Francisco disse no avião de volta de Yerevan, capital da Armênia, em resposta à pergunta de um jornalista sobre a viagem que o papa vai fazer a Lund, na Suécia, para os 500 anos da Reforma Protestante.
A reportagem é de Gian Mario Gillio, publicada no sítio da revista Riforma, 27-06-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
"Calvino e os príncipes alemães queriam o cisma", continuou Francisco.
"Devemos nos colocar na história da época, não é fácil de entender.
Hoje, tentamos retomar o caminho para nos reencontrar depois de 500
anos. Rezar juntos, trabalhar juntos pelos pobres. Mas isso não basta. O
dia da unidade plena, dizem alguns, será o dia depois da vinda do Filho
do Homem. Enquanto isso, devemos rezar, dialogar e trabalhar juntos por
tantas coisas, como combater contra a exploração das pessoas. No plano
teológico, enfim, com os luteranos, estamos de acordo sobre o tema da
justificação. O documento conjunto sobre esse tema é um dos mais claros.
Os irmãos – concluiu o papa – se respeitam e se amam."
Recolhemos duas declarações, a do teólogo Fulvio Ferrario, decano da Faculdade Valdense de Teologia, e do professor Paolo Ricca, teólogo valdense.
"O papa expressa conceitos interessantes e que, de forma geral, recebemos com prazer", declarou o pastor Fulvio Ferrario, decano da Faculdade Valdense de Teologia de Roma. "O papa falou 'de improviso' no voo de retorno de Yerevan,
respondendo a uma das tantas perguntas feitas pelos jornalistas
presentes. Portanto, essas declarações não devem ser assumidas como
teses doutrinais. Elas certamente se colocam em continuidade com o
pensamento e a obra do Papa Francisco. Indo por pontos – continua Ferrario – as apreciações em relação a Lutero e à Reforma
devem ser inseridos e colocados em uma série de posicionamentos
explícitos do pontífice, divulgados nesses anos e com os quais nos
alegramos. Outras externalizações não parecem ser muito claras (por
exemplo: 'Calvino queria o cisma'). Também no que diz respeito às perspectivas, só podemos estar de acordo. Depois, quando Francisco afirma que 'a plena unidade entre católicos e reformados acontecerá somente quando o Senhor voltar' – concluiu Ferrario
–, talvez seja necessário entender. Pode ser que o pontífice pensava em
uma Igreja única, e esta, efetivamente, não está à vista e, quando o
Senhor voltará, não será nem mesmo necessária. Em vez disso, pode-se
pensar na plena comunhão, em torno da Palavra de Deus e da Ceia do
Senhor, de Igrejas que permanecem diferentes, cada uma com os carismas
próprios, que enriquecem a fraternidade e a sororidade ecumênicas."
O professor Paolo Ricca identifica quatro afirmações
positivas e três muito discutíveis, "para não ter que dizer que não
correspondem à realidade histórica".
"A primeira – explica Ricca –, Lutero era um reformador. Portanto, ele não era um rebelde, não era um herege, não era um cismático. Se quisermos colocar Lutero na galeria dos reformadores, devemos colocá-lo no lugar certo. Segunda
afirmação positiva: 'Os irmãos se respeitam e se amam'. Respeitar um
irmão significa que você respeita as razões da sua diversidade; sobre o
amor, não há nada a reiterar. A terceira afirmação
positiva: a menção ao acordo sobre a justificação. Um acordo
objetivamente importante, embora seria preciso reconhecer, e eu não
saberia dizer se o papa sabia disso ou não, que ele não produziu,
infelizmente, nada de significativo nas relações entre a Igreja Católica e a Luterana.
Tudo permaneceu como antes. Parece ser um paradoxo produzir um acordo
sobre o que, para os luteranos, é o coração do Evangelho, ou seja, a
doutrina da justificação, enquanto, no sistema católico, a justificação,
de fato, não ocupa aquele lugar central que ocupa no universo teológico
luterano. Mas o fato de o papa ter feito referência a ela, portanto, de
tê-la mencionado como importante, é um fato positivo. A última afirmação é que a unidade ainda não é possível: a unidade plena, defende Francisco, pode estar muito distante, até mesmo depois do retorno de Cristo, mas isso não impede que se dialogue e se reze juntos."
"As três afirmações discutíveis que não correspondem à realidade histórica – continua Ricca – dizem respeito à Reforma, em primeiro lugar, sobre os 'métodos equivocados'. A Reforma começou precisamente com o método do diálogo teológico. As 95 teses de Lutero
eram oferecidas à discussão pública, para um debate que, depois, não
houve, mas que, ao contrário, deveria ter acontecido, nas intenções. Ele
nunca aconteceu porque, às teses, foram contrapostas as polêmicas, e
não a discussão, entrando no mérito das propostas. Em vez disso, o
método era precisamente o diálogo teológico, o único possível. Portanto,
não se pode defini-lo como equivocado. A segunda coisa
que não corresponde à realidade é dizer que a 'Igreja não era exemplar,
corrupção, mundanidade, luta de poder'. Certamente, havia isso também,
mas esse não é o ponto, e nunca o foi. O ponto verdadeiro sobre o qual a
Reforma Protestante se deteve não era um problema
moral, mas teológico. Se não entendermos isso, entendemos fatalmente mal
a Reforma como tal. O tema das 95 teses era a verdadeira penitência cristã: o que significa arrependimento. A terceira afirmação que não corresponde, de fato, à realidade histórica é a sobre Calvino
e os príncipes alemães que queriam o cisma. Nada disso. Uma minoria dos
princípes alemães assinou – a maioria estava com o imperador e,
portanto, com a religião tradicional – a confissão de Augsburgo de 1530 para pedir uma unidade diferenciada dentro do império. Portanto, nada de cisma. Sem falar do citado Calvino distante daqueles fatos, como demonstra a história."
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