terça-feira, 12 de abril de 2011

Para nos firmar na virtude, de tempos em tempos envia-nos Deus securas

As securas são privações das consolações sensíveis e espirituais, que facilitavam a oração e a prática das virtudes. Apesar de esforços muitas vezes renovados, não se sente gosto na oração, experimenta-se nela até enfado, cansaço, e o tempo parece que não tem fim; dir-se-iam adormecidas a fé e a esperança, e a alma, privada de toda a alegria, vive numa espécie de torpor; não opera já senão a golpes de vontade. É este, sem dúvida, um estado sumamente penoso; mas também tem suas utilidades.
 Quando Deus nos envia securas, é para nos desprender de tudo quanto é criado, até mesmo da doçura que se encontra na piedade, para aprendermos a amar a Deus só, e por si mesmo. Quer também humilhar-nos e mostrar-nos que as consolações são favores essencialmente gratuitos. Com as securas, Deus também nos purifica mais, tanto das faltas passadas como das afeições presentes e de qualquer inclinação egoísta: quando se tem de servir a Deus sem gosto, por convicção e vontade, sofre-se muito, e este sofrimento é expiatório e reparador. Robustece-nos, enfim, na virtude: porquanto, para continuar a orar e a praticar o bem, é preciso exercitar com energia e constância a vontade, e por meio deste exercício é que se fortifica a virtude.
 
Como as securas vêm às vezes das nossas faltas, é preciso, antes de tudo, examinar seriamente, mas sem excessiva inquietação, se delas não somos responsáveis. Isto se dá quando: por certos movimentos mais ou menos consentidos de vã complacência e de orgulho; por uma espécie de preguiça espiritual, ou, ao contrário, por uma contensão de espírito intempestiva; pela busca de consolações humanas, de amizades demasiado sensíveis, de prazeres mundanos, porque Deus não quer nada dum coração dividido; pela falta de lealdade com o diretor, porquanto uma vez que mentis ao Espírito Santo, diz São Francisco de Sales, não é maravilha que Ele vos recuse a sua consolação. – E encontrada a causa destas aridezes, é humilhar-se e esforçar-se por suprimi-la.
 
Se não lhe demos causa, importa utilizar bem esta provação. O melhor meio para o conseguir, é persuadirmo-nos que servir a Deus sem gosto e sentimento é mais meritório que fazê-lo com muita consolação; que basta querer amar a Deus, para o amar, e que, enfim, o ato mais perfeito de amor é conformar a própria vontade com a de Deus. Para tornar este ato mais meritório ainda, não há nada melhor que unir-se a Jesus que, no Jardim das Oliveiras, se dignou sentir o tédio e a tristeza por amor de nós. Mas o que sobretudo importa é não perder nunca o ânimo, nem cercear nada dos seus exercícios, dos seus esforços, da sua resoluções; antes imitar a Nosso Senhor Jesus Cristo que, mergulhado na agonia, orou mais longamente.

Para ser bem compreendida pelos dirigidos esta doutrina sobre as consolações e securas, é necessário repeti-la muitas vezes; porque, apesar de tudo, eles crêem que vão muito melhor, quando tudo corre à medida dos seus desejos, do que quando é necessário remar contra a corrente. Pouco a pouco, porém, faz-se luz; e as almas, que á não se envaidecem no momento da consolação, nem perdem o ânimo no tempo da secura, estão dispostas para fazerem progressos muito mais rápidos e constantes.

 
Adaptado do texto de Adolph Tanquerey na obra "A Vida Espiritual: explicada e comentada"

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