23 Março 2012
“Os que estiverem vivos invejarão tanto os mortos que desejarão a morte, mas a morte os enganará.” (Apocalipse 9:6)
midiasemmascara - De
certa forma, os filmes de zumbis e mortos-vivos prepararam nosso
imaginário para as imagens que acompanham este artigo. Tudo começa com
um esverdeamento da pele, escamação, putrefação e apodrecimento dos
tecidos. Surgem feridas que aumentam até o desaparecimento dos músculos e
nervos que cobrem os ossos e o resultado são verdadeiros mortos-vivos
agonizando até a morte certa. Em muitos casos, também os ossos são
carcomidos por uma acidez mortificante que lembra as mais horripilantes
produções cinematográficas. Estes são os efeitos da droga mais popular
da Rússia, o krokodil, e suas imagens distribuídas pela internet nos
evocam um profundo medo sobre o que pode vir da macabra combinação entre
a indústria farmacêutica, o narcotráfico e as políticas de “redução de
danos” apoiadas pela ONU em todo o mundo. O fato é que tanto a imprensa
internacional quanto as organizações de saúde pelo mundo têm mostrado
uma preocupação velada e feito um certo silêncio em torno do assunto.
O
artigo de Maierovitch dá ênfase no interesse da única rede de farmácias
que produz os medicamentos com os quais são feitos o krokodil, que são o
Terpincod, o Codelac e o Pentalgin. Acontece que a rede de farmácias
Pharmastandard pertence aos filhos da ministra da Vigilância Sanitária,
Tatiana Golikova com o ministro Viktor Khristenko, da pasta de Indústria
e Comércio. Vladimir Kalanda, do serviço federal russo Antidrogas, diz
que os efeitos imediatos do krokodil são semelhantes aos da heroína, mas
o custo para o usuário é três vezes menor.
“Em
2005, poucas regiões do país usavam fármacos contendo codeína para
preparar a desomorfina. Atualmente, o consumo da desomorfina se
popularizou”, disse Kalanda em entrevista à mídia européia. Diferente da
heroína, porém, os usuários do krokodil morrem num período médio de 2
anos.
A substância provoca necrose da pele, que fica enrugada e esverdeada. A acidez em face de certos insumos usados no preparo chega a dissolver o tecido ósseo. As mortes decorrem de (1) envenenamento do sangue, (2) pulmonite, (3) miningite ou (4) putrefação. (Kalanda)
Os
últimos relatórios da ONU têm demonstrado certa preocupação com o
crescimento do uso de drogas sintéticas no mundo. Mas para combater o
problema, os relatórios do órgão, estranhamente, sugerem maior repressão
aos produtores das drogas simultaneamente à descriminalização do uso
destas. Além é claro das políticas de redução de danos que são
amplamente apoiadas em todo o mundo e já há casos claros de engajamento
do próprio narcotráfico nestas campanhas.
No
mundo inteiro crescem as campanhas pela legalização das drogas,
concomitantemente às restrições ao uso de tabaco e álcool, usadas como
artifício de credibilidade científica e demonstração de boa fé e
preocupação com a saúde humana. Difícil é acreditar nesta boa fé depois
de assistir aos vídeos disponíveis na internet sobre os efeitos do
devastador krokodil.
(N. do E.: Imagens muito fortes.)
(N. do E.: Imagens muito fortes.)
Mas
de onde vem o interesse na liberação do uso de drogas de modo geral?
Quais os reais motivos da defesa do uso para variados fins? Essa é uma
pergunta difícil de responder e seria necessária uma ampla pesquisa de
fontes e uma sequência de depoimentos de acesso ainda mais complicado.
Uma das respostas, talvez a mais simples a partir do que temos à
disposição, com certeza está na grande vantagem a uma possível
governança global sobre cidadãos apáticos e sedados por prazeres
mundanos e sensitivos, rebanho fácil e rentável a qualquer
empreendimento de poder. Nisso também os apelos sexuais têm o seu papel,
que torna o ser humano mais aberto às sugestões externas justamente por
lhe faltar controle aos estímulos internos. Mas essa vantagem que o
poder tem com as drogas mais fortes nos fornece uma pista a uma resposta
ainda mais provável que se encontra um tanto escondida do público,
embora tenha influência determinante nos rumos globais. É na
possibilidade psicológica da alienação total das multidões que entra um
dos fatores hoje especialmente determinantes no curso das políticas
sociais globais: o poder crescente das seitas.
Peter Kreeft, autor do livro Como Vencer a Guerra Cultural,
afirma que a religião mais popular dos Estados Unidos hoje não é mais o
cristianismo, mas a chamada “espiritualidade”, ou seja, o arranjo
sincrético de variadas formas espirituais muitas vezes contraditórias,
mas, por definição, anticristãs. As milhares de seitas espalhadas pelo
mundo hoje têm uma origem comum, o gnostícismo pré-cristão,
especificamente aquele que se aliou ao poder durante o período
iluminista e que orientou a maioria dos rumos científicos, por meio da
figura do alquimista, expressa na metáfora gnóstica das luzes.
Milhares
de seitas ocultistas gnósticas hoje se utilizam de drogas em suas
cerimônicas. O Santo Daime é o exemplo mais conhecido e se engana quem
crê que a sua abrangência se restringe ao Brasil. Composto da folha de
chacrona (psychotria viridis), cipó jagube (banisteriopsis caapi), água
e, em alguns casos, anfetamina, a ayahuasca “eleva” o nível de
consciência dos praticantes e os “aproxima de Deus”, segundo os seus
líderes. A ayahuasca é usada por muito mais gente do que se imagina,
assim como a participação de celebridades nacionais e internacionais no
culto do Santo Daime. A morte do cartunista Glauco no ano passado
levantou a questão da seita na mídia, mas sem grandes aprofundamentos.
O
Santo Daime é proibido em quase todos os países do mundo, o que atrai
grande número de adoradores a países como o Brasil, movidos pela
curiosidade acerca do chá tropical que aqui é liberado. Em muitos casos,
é utilizado acrescido de anfetamina o que torna o usuário fatalmente
vítima de problemas psíquicos, como a paranóia e esquizofrenia.
O
perigo das drogas aliadas às seitas místicas espalhadas pelo mundo tem
motivado a criação de institutos de pesquisa e investigação sobre o
assunto. Na França, a União Nacional das Associações de Defesa das
Famílias e Indivíduos Vítimas de Seitas (http://www.unadfi.org)
alertou recentemente que as drogas não só estão presentes em todas as
seitas esotéricas como são parte essencial da “espiritualidade”
trabalhada por elas. Em outras palavras, o uso de drogas é o que mantém
crível a proposta de muitas seitas. Segundo muitos teóricos das próprias
seitas, a droga possibilita uma abertura ao transcendente e uma maior
compreensão das informações proveniente das “dimensões superiores”, o
que o aproxima das aspirações gnósticas e esotéricas em geral. O uso de
drogas estimula no usuário uma abertura, de fato, a teorias e
explicações que o seu efeito confirme, daí o crescimento proporcional do
uso de drogas e de seitas pelo mundo. Estas últimas em grande parte
sustentadas com dinheiro vindo diretamente do tráfico de drogas.
Como
sabemos, um dos elementos do gnosticismo é a busca do paraíso
terrestre, um mundo extra-temporal com acesso interior, em que reina o
prazer infinito e o conhecimento da ciência ou vontade divinas. Um
exemplo da relação entre drogas e gnosticismo é o famoso poema de Samuel
Taylor Coleridge, onde o poeta inglês narra um sonho que teve após
dormir sob efeito de ópio e ter visões de um castelo paradisíaco e
repleto de prazeres pertencente a Kubla Khan, antigo governante mongol. O
fato deste sonho coincidir, mais tarde, com a descoberta das prováveis
ruínas do suposto templo, sugeriram que Coleridge tivera uma visão
extra-temporal ou tivera visitado outra dimensão a partir do uso da
droga.
No
livro The Diary of a Drug Fiend, Aleister Crowley cita a experiência de
Coleridge. Crowley foi o bruxo criador do Satanismo moderno, se julgava
a Grande Besta e é ainda popular entre celebridades da política, das
artes e ciências em todo o Ocidente. Ele difundiu o uso de drogas como
parte de um processo de libertação espiritual. Crowley foi um dos mais
perversos personagens do século XX, era viciado em quase todo tipo de
droga, principalmente heroína, e levou isso até seu leito de morte. Era
aficcionado por oráculos chineses e dizia incorporar deidades orientais.
A cultura popular o transformou em um ícone com grande poder de
fascinação entre os jovens.
Yuri
Bezmenov, ex-agente da KGB, conta que a agência manifestava grande
interesse em exercer influência entre líderes de seitas indianas que
recebiam constantes visitas de celebridades americanas. A KGB tinha
objetivos claros quanto à influência destas doutrinas na sociedade
ocidental justamente pelo caráter de alienação que elas levavam aos
cidadãos. Em um contexto de Guerra Fria, não impressiona que o mundo
ocidental tenha sido invadido por cultos orientais e esotéricos em suas
formas mais toscas e deslocadas do seu sentido original. O objetivo era o
enfraquecimento da moralidade cristã, grande empecilho ao avanço do
comunismo.
A
busca pela transcendência e pelo conhecimento das razões e dos sentidos
dos mundos espirituais passou a ganhar certo prestígio no século XX, a
partir da contracultura, com o resgate de nomes como Crowley, Spare e
Blavatsky e sua inclusão na cultura pop, por conta da articulação das
seitas gnósticas. As experiências extra-corpóreas, as visões de anjos e
interações com entidades, sensações que remetem a um relacionamento
direto com os mundos imateriais e outras dimensões de existência,
finalmente deixaram de ser exclusividade dos mestres, dos sacerdotes e
dos bruxos. Qualquer jovem, desiludido com o mundo que o cerca e com a
imposição de padrões comportamentais dos quais ele discordarva, podia,
afinal, conhecer o maravilhoso mundo das descobertas transcendentes e
das experiências com criaturas verdes e espíritos de luz, mediante o
simples e banal uso de uma droga entorpecente facilmente acessível, de
consumo incentivado por meio da conduta de artistas comprovadamente
orientados por mestres de seitas.
Cristian Derosa é jornalista.
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