O termo técnico “união hipostática” é usado em teologia para se
referir à forma como Deus e a humanidade estão unidos em Jesus Cristo.
Não é possível, porém, entender o mistério dessa união sem antes
entender um outro mistério: o da Encarnação.
Existem duas naturezas: humana e divina. Entre uma e outra há um
abismo, uma distância intransponível entre o homem e Deus. Tal distância
já existia antes do pecado original, e este somente a aumentou. A
distância entre Criador e criatura faz parte da natureza das coisas.
Não é errado dizer que sozinho o ser humano jamais chegará até Deus,
ainda que empreenda os maiores esforços. É impossível e qualquer esforço
humano nesse sentido é semelhante à Torre de Babel. Ao homem, portanto,
só resta clamar misericórdia e pedir a Deus que venha. Ele veio.
Deus veio ao encontro do homem. No entanto, pelo fato de Deus ser uma
realidade tão portentosa, magnífica e poderosa não poderia simplesmente
“aparecer”, pois isso seria insuportável para a humanidade. A Sua
glória é tamanha que se ela se manifestasse plenamente as criaturas se
diluíriam em Deus. Não seria possível ao homem suportar tão grande
majestade.
Deus resolveu esse problema se encarnando no seio de Maria. Uma das
pessoas da Santíssima Trindade (o Filho) se fez homem, de tal forma que
em Jesus Cristo a humanidade e a divindade estão unidas numa espécie de
casamento. A analogia é perfeita, pois naquele, os dois se tornam uma só
carne, mas as duas realidades continuam distintas.
É possível dizer também que Ele é o próprio casamento, não somente o
Esposo. Ele é o casamento entre Deus e o homem. Os que estavam
infinitamente separados, em Jesus, agora estão unidos, mas não de modo
que a humanidade desapareça. Ela permanece.
A palavra “hipóstases” em grego é usada para designar “pessoa”;
porém, é mais forte que o termo latino “persona”, pois recorda que se
trata de uma relação substancial. Assim, a união entre Deus e o homem
não se dá de forma acidental, como se Deus assumisse a humanidade como
uma pessoa coloca acidentalmente brincos, peruca, chapéu, cachecol… Não.
A humanidade de Cristo tem como substrato a pessoa do Verbo Eterno. Não
se trata de uma união acidental, portanto, mas substancial.
Desse modo, existe um só Filho: Deus e homem ao mesmo tempo. Conforme afirmado pela Igreja desde o Concílio de Calcedônia:
Se bem que, desde aquele início no qual o Verbo se fez carne no útero da Virgem, jamais tenha existido entre as duas formas divisão alguma e durante todas as etapas do crescimento do corpo as ações sempre tenham sido de uma única pessoa, todavia não confundimos, por mistura alguma, o que foi feito de maneira inseparável, mas percebemos pela qualidade das obras que cada coisa seja própria de cada forma… Embora, de fato, seja um só o Senhor Jesus Cristo e, nele, uma única e a mesma seja a pessoa da verdadeira divindade e da verdadeira humanidade, compreendemos todavia que a exaltação com a qual, como diz o Doutor dos gentios, Deus o exaltou e lhe deu um nome que supera todo nome, se refere àquela forma que devia ser enriquecida com o aumento de tão grande glorificação. (DH 317 e 318)
A união entre as duas naturezas na pessoa de Jesus Cristo é
substancial. O mistério da união hipostática se reverte em graça
santificante para a humanidade, pois, pela humanidade de Cristo pôde ser
também ela unida à divindade, mesmo que de modo acidental. Trata-se de
uma graça incomensurável de Deus para com sua criatura que jamais seria
capaz de transpor o abismo que a separa de seu Criador de quem tudo
brota e de onde vem a salvação.
Fonte: Padre Paulo Ricardo
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