Últimos instantes do Conclave, 13 de março de 2013. Ao lado do argentino Jorge Mario Bergoglio, estava o brasileiro Cláudio Hummes:
“Não tinha preparado nada. A frase “não se esqueça dos pobres” ao novo
Papa me veio espontaneamente. O efeito provocado, obviamente não o
esperava. Alguns minutos depois, Bergoglio comunicava que o seu novo nome seria Francisco, recordando São Francisco de Assis,
o homem dos pobres, da paz, do cuidado da criação. Creio que toda a
assembleia ficou surpresa e feliz por esta escolha, que depois se
demonstrou um farol do pontificado”, responde do Brasil o ex-prefeito da
Congregação para o Clero, que em menos de dois meses estará em Roma
para o Jubileu. Hummes é um caro amigo e o primeiro aliado de Bergoglio.
O brasileiro foi arcebispo de São Paulo, o argentino de Buenos Aires:
os cardeais sul-americanos mais admirados no Vaticano. Ambos papáveis em
2005. No segundo Conclave, Bergoglio foi eleito.
A entrevista é de Carlo Tecce, publicada por il Fatto Quotidiano, 18-10-2015. A tradução é de IHU On-Line.
Eis a entrevista.
A fumaça branca está longe. Agora acontece o Sínodo sobre a Família e Bergoglio se confronta com os conservadores. Além da carta, há os protestos. Há alguns que querem obstaculizar Francisco?
A Igreja é uma comunhão, não uma massa uniforme. Mais. Ela se
constitui uma unidade na diversidade. Certamente, a diversidade não
pode resultar numa divisão. Isto seria destrutivo. Mas uma adequada
diversidade enriquece a Igreja. Podemos compará-la com uma estrada
sinodal. Trata-se de caminhar juntos, para o futuro, com todas as nossas
legítimas diferenças, mas sempre na unidade de fé, esperança e amor,
para o Pai nos céus, por meio de Jesus Cristo. A diferença de visões e
de experiências, no momento do debate sinodal, ajuda a aprofundar as
coisas. Mas no fim deve prevalecer a comunhão presidida pelo Papa, que é
o Pastor de toda a Igreja. Todos somos corresponsáveis pela Igreja, mas
o Papa é o que foi querido por Jesus como aquele que guia.
Voltará a estação dos corvos como nos últimos meses de Ratzinger?
Não acredito. Para mim, aquele clima em que aconteceu o Vatileaks, não existe mais. O caso desta carta não significa um retorno daquele clima.
Outra notícia recente: para o padre gay Charamsa, a Igreja é homofóbica.
Sem entrar no caso citado, não diria que a Igreja é homofóbica. Quando o papa Francisco,
no caso do homossexual que busca a Deus, disse “quem sou eu para
julgar?”, deu um sinal: a Igreja deve vencer uma atitude preconceituosa
neste tema e, sobretudo, deve respeitar estas pessoas.
O que a Igreja pode fazer para acolher os divorciados recasados e os casais homossexuais e por que muitos recusam qualquer abertura?
Não se trará de negar a indissolubilidade do vínculo matrimonial, mas
de buscar um caminho penitencial para os divorciados recasados. Digo:
buscar.
Existe uma tal possibilidade?
É o que a Igreja, no momento, está procurando. Se existe, não se deve
refutá-la. Além disso, a Igreja propõe que os casais divorciados apelem
ao tribunal eclesiástico para verificar se o casamento foi válido ou
não.
Quais são os desafios para o pontificado de Bergoglio?
Para o pontífice, a relação entre ambiente e desenvolvimento é um
ponto fundamental. Este é, seguramente, um dos desafios mais difíceis
não somente para a Igreja, mas para a humanidade. A questão não se reduz
a um argumento ecologista, mas se apresenta como uma tarefa social, que
diz respeito sobretudo à transformação do atual sistema
econômico-produtivo-financeiro global. Trata-se de colocar a pessoa
humana no centro, e não o dinheiro e o lucro a qualquer custo, inclusive
de vidas humanas. O atual sistema devasta o planeta e sacrifica milhões
de pessoas.
Outro desafio do Papa é reformar a Igreja no sentido de transformá-la
numa Igreja missionária, “em saída”, que demole os muros e constrói
pontes para andar ao encontro de todos, mas prioritariamente “nas
periferias” humanas e sociais e ali anuncia Jesus Cristo e pratica a
misericórdia. A misericórdia fará a diferença numa sociedade egoísta,
individualista, fascinada pelo dinheiro.
Uma misericórdia baseada na justiça social, que defende e promove os
direitos de todos aos bens materiais, culturais e espirituais da
humanidade. O Papa tem falado dos três ‘t” (terra, teto e trabalho): são
direitos dos pobres.
O Papa convocou um Jubileu extraordinário. O próximo será em dez anos. Bergoglio ficará até o fim do pontificado ou também poderá renunciar?
Espero e rezo a Deus para que o nosso amado Papa tenha um longo
pontificado. Todo o resto são especulações. Em geral, considero que a
renúncia de um Papa sempre é possível. Mas não vejo o Papa preocupado
com o seu futuro.
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