Numa carta ao presidente russo o Papa Francisco constata que demasiados interesses particulares impediram que se evitasse o massacre do conflito na Síria
Os chefes dos Estados do G20 tomem consciência que é vã a pretensão de
uma solução militar da crise da Síria. Escreve o Papa Francisco ao presidente da
Federação Russa Vladimir Putin, numa carta que lhe foi enviada por ocasião da
reunião em São Petersburgo. A visão da Santa Sé sobre o Futuro da martirizada
população síria foi apresentada ao corpo diplomático acreditado, pelo arcebispo
Mamberti esta manhã, quinta-feira 5 de Setembro, no Vaticano.
A Sua Excelência
Sr. Vladimir PUTIN
Presidente da Federação Russa
No ano que está a decorrer, Vossa Excelência tem a honra e a
responsabilidade de presidir ao Grupo das vinte maiores economias mundiais.
Estou ciente de que a Federação Russa participou neste Grupo desde a sua
criação e desempenhou sempre um papel positivo na promoção da governabilidade
das finanças mundiais profundamente atingidas pela crise que teve início em
2008.
O contexto actual, altamente interdependente, exige uma moldura
financeira mundial, com regras justas e claras próprias, para conseguir um mundo
mais equitativo e solidário, no qual seja possível eliminar a fome, oferecer a
todos um trabalho digno, uma habitação decorosa e a necessária assistência no
campo da saúde. A sua presidência do G20 para o ano que está a decorrer assumiu
o compromisso de consolidar a reforma das organizações financeiras
internacionais e de chegar a um consenso sobre os stardards financeiros
adequados às actuais circunstâncias. Não obstante, a economia mundial poderá
desenvolver-se realmente na medida em que for capaz de permitir uma vida digna a
todos os seres humanos, desde os mais idosos até às crianças ainda no seio
materno, não só aos cidadãos dos países membros do G20, mas a cada habitante da
Terra, até a quantos se encontram nas situações sociais mais difíceis ou nos
lugares mais longínquos.
Nesta óptica, torna-se claro que na vida dos povos os conflitos
armados constituem sempre a deliberada negação de qualquer concórdia
internacional possível, originando divisões profundas e dilacerantes feridas que
necessitam de muitos anos para se curarem. As guerras constituem a rejeição
prática de se comprometer para alcançar aquelas grandes metas económicas e
sociais que a comunidade internacional estabeleceu, tais como, por exemplo, o
Millenium development Goals. Infelizmente, os demasiados conflitos
armados que ainda hoje afligem o mundo apresentam-nos, todos os dias, uma
dramática imagem de miséria, fome, doenças e morte. Com efeito, sem paz não há
qualquer tipo de desenvolvimento económico. A violência nunca leva à paz,
condição necessária para este desenvolvimento.
O encontro dos Chefes de Estado e de Governo das vinte maiores
economias, que representam dois terços da população e 90% do PIB mundial, não
tem a segurança internacional como sua finalidade principal. Contudo, não poderá
prescindir de reflectir sobre a situação no Médio Oriente e em particular na
Síria. Infelizmente, é doloroso constatar que demasiados interesses particulares
prevaleceram desde quando teve início o conflito sírio, impedindo que fosse
encontrada uma solução que evitasse o inútil massacre ao qual estamos a
assistir. Os líderes dos Estados do G20 não permaneçam inertes face aos dramas
que já vive há demasiado tempo a amada população síria e que correm o risco de
causar novos sofrimentos a uma região tão provada e necessitada de paz. A todos
eles, e a cada um deles, dirijo um sentido apelo para que ajudem a encontrar
caminhos para superar as diversas contraposições e abandonem qualquer vã
pretensão de uma solução militar. Haja, antes, um novo compromisso a perseguir,
com coragem e determinação, uma solução pacífica através do diálogo e da
negociação entre as partes em causa com o apoio concorde da comunidade
internacional. Além disso, é um dever moral de todos os Governos do mundo
favorecer qualquer iniciativa que vise a promoção da assistência humanitária a
quantos sofrem por causa do conflito dentro e fora do país.
Senhor Presidente, na esperança que estas reflexões possam
constituir uma válida contribuição espiritual para o vosso encontro, rezo por um
êxito frutuoso dos trabalhos do G20. Invoco abundantes bênçãos sobre a Cimeira
de São Petersbugo, sobre todos os participantes, sobre os cidadãos de todos os
Estados membros e sobre todas as actividades e compromissos da Presidência Russa
do G20 no ano de 2013.
Ao pedir-lhe que reze por mim, aproveito o ensejo para lhe
expressar, Senhor Presidente, a minha mais sentida estima.
Francisco
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