Pe. Hélio Luciano responde a várias questões sobre fé e Igreja
Por Thácio Lincon Soares de Siqueira
BRASíLIA, 03 de Outubro de 2013 (Zenit.org)
- Ultimamente a edição portuguesa de ZENIT tem recebido várias
perguntas que abrangem os mais variados temas de fé e de Igreja.
Para
respondê-las pedimos ajuda ao Pe. Hélio Luciano, mestre em bioética
pela Universidade de Navarra, mestre em Teologia Moral pela Pontificia
Universidade Santa Cruz em Roma e membro da comissão de bioética da
CNBB, que se dispôs com muito carinho a responder as perguntas
selecionadas.
Publicamos a primeira parte sexta-feira, 27 de Setembro. A segunda parte no dia 30 de Setembro e abaixo publicamos a terceira e última parte.
Acompanhe abaixo as perguntas sobre o Papa Francisco e a Teologia da Libertação, e sobre os casamentos de segunda união.
***
ZENIT: É verdade que o Papa Francisco, chamou o Leonardo Boff para uma conversa porque concorda com a teologia da libertação e tem a mesma opção pelos pobres?
Pe. Hélio: Na verdade, em relação ao convite do Santo Padre a Leonardo Boff, pouco podemos saber se são verdades ou bravatas. Ao mesmo tempo, não haveria nenhum problema em tal convite. A Igreja nunca se fecha ao diálogo e é importante conversar com todos – o Papa Bento teve um célebre diálogo com Hans Küng, um grande crítico da Igreja.
Quem se fechou ao diálogo nos últimos anos foi o próprio Leonardo
Boff – praticamente demonizando o Papa Bento. A abertura a este diálogo
seria benéfica tanto à Igreja como ao próprio Boff, mas não significaria
uma mera concordância, mas sim uma abertura ao diálogo.
Do mesmo modo, não podemos demonizar a teologia da libertação em si
mesma. Os aspectos positivos e negativos foram ressaltados nos dois
documentos da Igreja – um de 1984 e outro de 1986 – sobre o tema.
Suponho que a teologia da libertação que trabalhe dentro de tais limites
e sem se tornar discurso ideológico, pode enriquecer a teologia.
ZENIT: É verdade que as normas da igreja proíbem os padres de confessar às pessoas divorciadas?
Pe. Hélio: Aqui existe um problema pastoral sério e voltamos ao tema do filho pródigo. Há muitos anos não estamos conseguindo dar verdadeira formação àqueles que vão casar – não os evangelizamos desde a infância e depois cremos que com 4 horas de formação para noivos estarão preparados para contrair matrimônio. Isso é burocracia e não mostrar o rosto de Cristo. Depois não acompanhamos as pessoas que se casam – a grande maioria nem frequenta a Missa, pois não conseguimos fazer que entendam a beleza da Eucaristia. A consequência é que o número de separações e divórcios é cada vez maior (351 mil divórcios no Brasil em 2011). A culpa é de quem? Nossa, como Igreja, que não evangelizamos.
Um número também cada vez maior de pessoas que se separaram ou se
divorciaram optam por unir-se novamente, com esperança de que desta vez
dê certo. Em primeiro lugar, nosso papel não pode ser de meros juízes,
colocando o dedo na ferida. Tais pessoas estão machucadas pela vida e
normalmente passaram por situações muito difíceis na união anterior.
Nosso papel deve ser de acolher, escutar, ajudar, sempre a partir da
verdade e evitando extremismos. Acolher no sentido de mostrar a essas
pessoas que elas continuam sendo filhas de Deus e que fazem parte da
Igreja. Escutar a história de cada uma, tendo misericórdia, ou seja,
colocando a dor do outro no nosso próprio coração. Ajudar tentando
oferecer a ela o caminho de felicidade proposto por Cristo, não como uma
carga na sua vida, mas como o modo de que encontre plenamente sua
felicidade.
Em muitos casos – não todos – o primeiro matrimônio foi nulo, ou
seja, nunca aconteceu. São 19 as causas de nulidade e hoje, como muitos
casam sem saber o que é verdadeiramente o matrimônio, ou sem assumir os
compromissos que derivam do mesmo, temos grande número de casamentos
inválidos. É direito do fiel poder recorrer ao Tribunal Eclesiástico
para saber se seu matrimônio aconteceu de fato ou não.
No caso de que o primeiro matrimônio seja válido, devemos deixar
claro a situação da pessoa e ajudá-la a que, livremente, encontre-se com
Cristo. Os extremismos só prejudicam. Por um lado os rigorismos, de
aplicar simplesmente a lei, sem ver a pessoa, só aumentam o sofrimento e
excluem as pessoas da Igreja – Jesus Cristo veio para os doentes e não
para os sãos. Por outro lado, o laxismo de não ver que existe um
problema a ser sanado, também cria nas pessoas conflitos de consciência –
ninguém trata um câncer simplesmente dizendo que ele não existe.
O sacramento do matrimônio, quando válido, dura até a morte de um dos
cônjuges. A pessoa em segunda união deve saber que está casada
realmente com o seu(ua) primeiro(a) esposo(a). Enquanto permanecer em
segunda união – e existem casos que não devemos nem mesmo aconselhar que
se dissolva, seja pelo bem dos filhos, seja para evitar que venha a se
tornar uma terceira ou quarta união – a pessoa pode comungar da Palavra e
fazer comunhões espirituais na Missa, participando de Cristo naquele
grau que hoje ela é capaz de alcançar. Mas não pode comungar e nem
receber a absolvição, pois ainda não há o claro propósito de emenda.
Tal situação não significa menor santidade – existem muitas pessoas
em segunda união muito mais santas que pessoas que comungam diariamente –
nem mesmo exclusão da vida da Igreja (estas pessoas podem e devem
participar da vida pastoral da Igreja). Trata-se sim de um processo
pessoal de conversão, que pode durar anos e que só Deus e a própria
pessoa podem intervir.
Nenhum comentário:
Postar um comentário