Redação (Terça-feira, 07-01-2014, Gaudium Press) -
Logo após o Santo Natal, a Igreja comemora a Epifania do Senhor e em
seguida vem a o Batismo do Senhor: "Porque Jesus quis ser batizado?".
Esta expressiva pergunta é respondida por Monsenhor João Clá Dias, EP.
em um artigo que leva o mesmo nome e que hoje transcrevemos.
O batismo conferido por São João não era
da mesma natureza que o Batismo sacramental, instituído posteriormente
por Nosso Senhor Jesus Cristo. Provinha verdadeiramente de Deus, mas não
tinha o poder de conferir a graça santificante. O próprio Batista pôs
em realce a diferença: Eu vos batizo na água, mas eis que vem outro mais
poderoso do que eu, a quem não sou digno de lhe desatar a correia das
sandálias; ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo. (Lc 3, 16).
O efeito do batismo de João consistia
num incentivo ao arrependimento dos pecados, explica São Tomás de
Aquino. Ora, em Jesus não havia sequer sombra de pecado, nem poderia
haver, uma vez que Ele era o Homem-Deus. Não tinha, portanto, matéria
para arrependimento e penitência. O que explica, então, que Ele tenha
querido ser batizado? Várias são as razões dadas pelos Padres e Doutores
da Igreja Eis uma delas: quando o Verbo se fez Homem, Ele quis se
sujeitar às leis que regem a vida humana. Por exemplo, obedeceu às leis
que estavam em vigor entre os judeus,
sendo apresentado no Templo após seu nascimento, sofrendo a
circuncisão, e cumprindo os ritos da Páscoa judaica. Assim, quis também
receber o batismo penitencial de João. Perdido no meio da multidão,
Jesus inocente. submeteu-se a um rito destinado ao pecador: Convém
cumpramos a justiça completa., justificou-se Ele perante o profeta.
Comentando essas palavras, Santo Agostinho diz que Nosso Senhor quis
fazer o que ordenou que todos fizessem... E Santo Ambrósio acrescenta: A
justiça exige que comecemos por fazer o que queremos que os outros
façam, e exortemos os outros a nos imitarem pelo nosso exemplo.
Entre as dez razões enumeradas na Suma
Teológica para o batismo de Jesus, São Tomás de Aquino coloca em
destaque o objetivo da purificação das águas. Citando Santo Ambrósio,
diz o Doutor Angélico que. o Senhor foi batizado, não por querer
purificar-se, mas para purificar as águas... Desse modo, continua ele,
as águas. purificadas pelo contato com o corpo de Jesus Cristo, que não
conheceu o pecado, tivessem a virtude de batizar.. E conclui citando o
mesmo argumento, de São João Crisóstomo, de que Jesus. deixou as águas
santificadas para os que, depois, deveriam ser batizados. Temos aqui um
interessante problema teológico-metafísico: por que razão Deus escolheu a
água como matéria para o Batismo? A água é um elemento rico em
simbolismo. Por exemplo, é uma imagem da exuberância de Deus. Basta
considerar que três quartas partes da superfície da Terra são
constituídas por água. Também é símbolo de vida. É elemento essencial
para a manutenção de todos os seres vivos. Quanto mais abunda a água
numa região, maior é a quantidade de plantas e animais que ali se
desenvolvem. Além disso, ela é o elemento preponderante da matéria viva,
de modo tal que o próprio corpo humano é composto, na sua maior parte,
de água. Podemos considerá-la também um símbolo da bondade, do carinho e
da magnanimidade de Deus para com a humanidade. Agrada ao ser humano
vê-la cair, em forma de chuva, cristalina, refrescante, tornando fértil o
solo, favorecendo as plantações, limpando o ar. Vista por outro prisma,
tem ela uma potência descomunal de destruição. Apesar de toda a técnica
moderna, e de um presunçoso progresso que se julgou capaz de um dia
conseguir dominar os elementos da natureza, os
homens se espantam e se aterrorizam com a força destruidora das águas. E
ainda nisso ela é para nós um símbolo, o do poder onipotente de Deus.
Por sua capacidade de lavar, ela lembra a limpeza espiritual. Por
diversas vezes a Sagrada Escritura assim a ela se refere, como no
seguinte trecho:Derramarei sobre vós águas puras, que vos purificarão de
todas as vossas imundícies e de todas as vossas abominações. (Ez 36,
25). Nessa passagem, o profeta Ezequiel prediz o batismo de São João e,
mais especialmente, o Batismo sacramental, instituído por Jesus. Do
mesmo modo, ele é referido por Zacarias, quando este diz: Naquele dia
jorrará uma fonte para a casa de Deus e para os habitantes de Jerusalém,
que apagará os seus pecados e suas impurezas. (13, 1). Nada mais
conveniente, portanto, do que a água ser a matéria do Batismo. E nada
mais adequado que Deus encarnado ter querido purificá-la pelo contato de
seu sacratíssimo corpo.
Outro motivo, dos mais importantes, para
o Senhor decidir sujeitar-se ao ritual do Jordão era estimular nos
homens o desejo do Batismo sacramental. A recepção do Batismo é
necessária para a salvação, como demonstram as palavras de Jesus a
Nicodemos: Quem não renascer da água e do Espírito não poderá entrar no
Reino de Deus. (Jo 3, 5). Pelo tom categórico da afirmação, avalia-se a
importância desse Sacramento. O batismo de João levava ao arrependimento
dos pecados, mas não tinha o poder de perdoá-los. O Batismo
sacramental, instituído por Jesus Cristo, tem efeitos infinitamente
maiores. Adão transmitiu a todos os seus descendentes a culpa original. O
Sacramento do Batismo limpa a alma da mancha desse pecado, confere a
graça santificante, eleva o homem à condição de filho de Deus e abre-lhe
as portas do Céu. Ele é a chave de todos os outros Sacramentos,
indispensáveis para o homem cumprir com fidelidade a Lei de Deus. tal é a
grandeza e a eficácia do Sacramento do Batismo.
Por Monsenhor João Scognamiglio Clá Dias EP, In Revista Arautos do Evangelho, janeiro de 2003.
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