quarta-feira, 7 de novembro de 2018

A Igreja é Escatológica

[cancaonova]
Por Prof. Felipe Aquino

Escatologia é o estudo sobre os “últimos acontecimentos”. A palavra vem do grego eschatón (= último). Se refere ao término da história da salvação. Sem isto não compreendemos a vida da Igreja. Os romanos diziam: “em tudo que faças, considera o fim, pois é o fim que dita o itinerário a percorrer”.
 



A realização da Igreja se dará plenamente só na eternidade.

O Concílio Vaticano II afirma:

“É no fim dos tempos que será gloriosamente consumada [a Igreja], quando, segundo se lê nos Santos Padres, todos os justos, desde Adão, do justo Abel até o último eleito, serão congregados junto ao Pai na Igreja universal” (LG,2).
“A Igreja à qual somos todos chamados em Jesus Cristo… só será consumada na glória celeste, quando chegar o tempo da restauração de todas as coisas; e, como o gênero humano, também o mundo inteiro, que está intimamente unido ao homem e por ele atinge o seu fim, será totalmente renovado em Cristo” (LG,48).

Muitas passagens das Escrituras mostram isso:

At 3,21 – “Enviará ele o Cristo que vos foi destinado, Jesus, aquele que o céu deve conservar até os tempos da restauração universal, da qual falou Deus pela boca dos seus santos profetas”.
Quando de sua vinda gloriosa, Cristo inaugurará o seu Reino definitivo e toda a criação será renovada.
1Cor 15,24-28 – “Depois, virá o fim, quando entregar o Reino a Deus, ao Pai, depois de haver destruído todo principado, toda potestade e toda dominação. Porque é necessário que ele reine, até que ponha todos os inimigos debaixo de seus pés… E, quando tudo lhe estiver sujeito, então também o próprio Filho renderá homenagem àquele que lhe sujeitou todas as coisas, a fim de que Deus seja tudo em todos”.
São Paulo nos ensina que este é o “misterioso” desígnio da vontade do Pai na plenitude dos tempos:
Ef 1,10 – “Reunir em Cristo todas as coisas que estão na terra e no céu”.
Col 1,20 – “E por seu intermédio reconciliar consigo todas as criaturas, por intermédio daquele que, ao preço do próprio sangue na cruz, restabeleceu a paz a tudo quando existe na terra e nos céus”.
São Pedro fala dessa renovação do mundo e da gloria da Igreja:
2Pe 3,10-13 – “Entretanto, virá o dia do Senhor como ladrão. Naquele dia os céus passarão com ruído, os elementos abrasados se dissolverão, e será consumida a terra com todas as obras que ela contém… Nós, porém, segundo sua promessa, esperamos novos céus e uma nova terra, nos quais habitará a justiça”.
Sabemos que São Pedro escreve numa linguagem apocalíptica, e que não pode ser interpretada ao pé da letra.
O que sabemos de certo é que haverá a consumação do universo e a glória da Igreja, segundo o desígnio de Deus.
Is 65,16 – “Eis que faço novos céus e nova terra; e ninguém mais se recordará das coisas passadas; elas já não voltarão à mente”.
Ap 21,1 – “Vi um céu novo e uma terra nova, pois o primeiro céu e a primeira terra haviam desaparecido”.
É interessante notar o que Jesus disse aos apóstolos:
Mt 19,28 – “No dia da renovação do mundo, quando o Filho do homem estiver sentado no trono da glória…”
Mt 28,20 – “Eis que estou convosco até a consumação do século”.
Com relação à data em que acontecerá a renovação do mundo e a inauguração definitiva do Reino de Deus, ninguém sabe e não deve especular a respeito. Muitos se enganaram sobre isto e levaram muitos outros ao engano e ao desespero. Até grandes santos da Igreja erraram neste ponto. Podemos citar alguns exemplos:
S. Hipólito de Roma (?235) – chegou a afirmar que o final do mundo seria no ano 500…
Santo Irineu (?202) – confirmava a tese do Ps Barnabé, de que o final seria no ano 6000 após a criação do mundo…
Santo Ambrósio (?397) e S. Hilário de Poitres (?367) – apoiaram a mesma tese anterior.
S. Gaudêncio de Bréscia (?405) – indicava o ano 7000 após a criação.
No século V, com a queda de Roma (476), S. Jeronimo (?420), S.João Crisóstomo (?407), S.Leão Magno (?461), defendiam que face à queda de Roma, o fim do mundo estava próximo…
No século VI e VII, S. Gregório Magno (?604) afirmava como próxima a vinda de Cristo…
Muitas vezes as profecias sobre a vinda de Cristo iminente são sugeridas pela necessidade que temos de encontrar uma “saída” para os tempos difíceis em que se vive. Por isso a Igreja é muito cautelosa nesse ponto, e sempre nos lembra:
At 1,7 – “Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai fixou por sua própria autoridade”.
Mc 13,32 – “Quanto àquele dia e àquela hora, ninguém os conhece, nem mesmo os anjos do céu, nem mesmo o Filho, mas, sim, o Pai só”.
Santo Agostinho interpreta essa passagem dizendo que Jesus diz não saber esta data, porque está fora do depósito das verdades que Ele veio revelar aos homens; não pertence à sua missão de Salvador revelar essa data (In Ps 36 Migne 36,355).
O Magistério da Igreja quer que se respeite essa vontade de Deus de deixar oculta aos homens essa data.

No Concílio Universal de Latrão V, em 1516, foi decretado:

“Mandamos a todos os que estão, ou futuramente estarão incumbidos da pregação, que de modo nenhum presumam afirmar ou apregoar determinada época para os males vindouros para a vinda do Anticristo ou para o dia do juízo. Com efeito a Verdade diz: “Não toca a vós ter conhecimento dos tempos e momentos que o Pai fixou por Sua própria autoridade. Consta que os que até hoje ousaram afirmar tais coisas mentiram, e, por causa deles, não pouco sofreu a autoridade daqueles que pregam com retidão. Ninguém ouse predizer o futuro apelando para a Sagrada Escritura, nem afirmar o que quer que seja, como se o tivesse recebido do Espírito Santo ou de revelação particular, nem ouse apoiar-se sobre conjecturas vãs ou despropositadas. Cada qual deve, segundo o preceito divino, pregar o Evangelho a toda a criatura, aprender a detestar o vício, recomendar e ensinar a prática das virtudes, a paz e a caridade mútuas, tão recomendadas por nosso Redentor”.

Em 1318, o Papa João XXII, condenando os erros dos chamados Fraticelli disse:

“Há muitas outras coisas que esses homens presunçosos descrevem como que em sonho a respeito do curso dos tempos e do fim do mundo, muitas coisas a respeito da vinda do Anticristo, que lhes parece estar às portas, e que eles anunciam com vaidade lamentável. Declaramos que tais coisas são, em parte, frenéticas, em parte doentias, em parte fabulosas. Por isso nós os condenamos com os seus autores em vez de as divulgar ou refutar” (Curso de Escatologia – D. Estevão Bettencourt, págs. 123 /124).

A esperança da Igreja é a vida eterna onde o Reino de Deus será pleno. Jesus disse a Pilatos:

“Meu Reino não é deste mundo” (Jo 18,36).
Por isso, a Igreja aguarda vigilante a vinda do Senhor. Era a esperança dos Apóstolos:
Col 3,4 – “Quando Cristo, nossa vida, aparecer, então também vós aparecereis com ele na glória”.
1Jo 3,2 – “Caríssimos, desde agora somos filhos de Deus, mas não se manifestou ainda o que havemos de ser. Sabemos que, quando isto se manifestar, seremos semelhantes a Deus, por quanto o veremos como Ele é”.
Fil 3,20 – “Nós porém, somos cidadãos dos céus. É de lá que ansiosamente esperamos o Salvador, o Senhor Jesus Cristo, que transformará nosso mísero corpo, tornando-o semelhante ao seu corpo glorioso, em virtude do poder que tem de sujeitar a si toda criatura”.
A Igreja sabe que é peregrina neste mundo. O termo Paróquia quer dizer “terra de exílio”. São Paulo expressa bem esta realidade:
2 Cor 5,6 – “Sabemos que todo o tempo que passamos no corpo é um exílio longe do Senhor. Andamos na fé e não na visão. Estamos, repito, cheios de confiança, preferindo ausentar-nos deste corpo para ir habitar junto do Senhor”.

E o Apóstolo suspirava estar com Cristo:

Fil 1,23 – “Sinto-me pressionado dos dois lados: por uma parte, desejaria desprender-me para estar com Cristo – o que seria imensamente melhor”.
Fil 1,21 – “Porque para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro”.

Antes, porém, de reinarmos com Cristo compareceremos diante dele:

2 Cor 5,10 – “Porque teremos de comparecer diante do tribunal de Cristo, a fim de cada um ser remunerado pelas obras da vida corporal, conforme tiver praticado o bem ou o mal”.
E a esperança do Apóstolo é grande:
Rom 8,18 – “Tenho para mim que os sofrimentos da presente vida não tem proporção alguma com a glória que há de revelar-se em nós “.
2 Tm 2,11-12 – “Eis uma verdade absolutamente certa: Se morrermos com Ele, com Ele viveremos. Se soubermos perseverar com Ele reinaremos”.
Tt 2,13 – “Na expectativa da nossa esperança feliz, a aparição gloriosa de nosso grande Deus e Salvador, Jesus Cristo”.
Por esta esperança a Igreja busca a santidade, pois sabe que sem ela “ninguém pode ver o Senhor” (Hb 12,14).
Ser cristão em última instância, é desejar o céu, buscar a santidade e, para isso, desprender-se de todas as satisfações da terra, aspirando as celestes. Deus fez tudo nesta vida precário, passageiro, transitório, para que não nos acostumemos a viver na terra, como se aqui fosse o céu. O destino da Igreja é o céu, a terra é o caminho.
Os santos ansiavam pelo céu, diziam como Santa Teresinha:
“Tenho sede do céu, dessa mansão bem-aventurada, onde se amará Deus sem restrições”.

São belas, sobre o céu, as palavras de São Paulo:

1 Cor 2,9 – “Os olhos não viram, nem ouvidos ouviram, nem coração humano imaginou o que Deus tem preparado para aqueles que o amam”.
2 Cor 5,1 – “Sabemos, com efeito, que, quando for destruída esta tenda em que vivemos na terra, temos no céu uma casa feita por Deus, uma habitação eterna, que não foi feita por mãos humanas”.
E não se importava com o próprio envelhecimento:
2 Cor 4,16 – “Ainda que em nós se destrua o homem exterior, o interior renova-se de dia para dia”.

Jesus nos chama a olhar para o céu:

Mt 6,19-21 – “Não ajunteis para vós tesouros na terra… Ajuntai para vós tesouros no céu… porque, onde está o teu tesouro, lá também está teu coração”.
A maioria dos homens, mesmo os cristãos, ainda têm o tesouro e o coração na terra; por isso suas vidas espirituais são tíbias e os frutos são poucos.
Mt 18,21 – “Se queres ser perfeito, vai, vende os teus bens, e dá aos pobres, terás um tesouro no céu”.
Não é sem razão que S.Leão Magno dizia que “as mãos do pobre são o Banco de Deus”.
Mc 8,36 – “Que aproveitará ao homem ganhar o mundo inteiro, se vier a perder a sua vida?”

Santo Agostinho perguntava:

“De que vale viver bem, se não me é dado viver sempre?”
Jo 14,2-3 – “Na cada do meu Pai há muitas moradas… vou preparar-vos um lugar. Depois de ir, e vos preparar um lugar, voltarei e tomar-vos-ei comigo, para que, onde eu estou, também vós estejais”.
Infelizmente hoje, para o mundo, eternidade parece ser uma palavra morta. É a chamada “secularização”, o amor a este século, ao tempo presente. O materialismo, o relativismo, o liberalismo e o hedonismo (busca do prazer como fim) geraram a perda do infinito, do céu, onde está a grande realização do homem. Por isso hoje ele se arrasta como um verme e se desespera na lama da imoralidade, da depressão e do vazio.
Pagamos dolorosamente o preço da perda da fé e da esperança. Só Deus pode satisfazer “a fome” infinita que o homem traz em si – como ensina Santa Catarina de Sena, doutora da Igreja – pois, as criaturas não podem satisfazê-lo, uma vez que são inferiores ao homem. “Só Deus basta”.
O Corpo de Cristo, a Igreja, subsiste em três estados: militante, que está na terra a lutar; padecente, que se purifica no purgatório e triunfante, que já vive a bem-aventurança do céu. Ensina-nos o Concílio Vaticano II que:
“Até que o Senhor venha em sua majestade e com ele todos os anjos, e destruída a morte, todas as coisas lhe sejam sujeitas, alguns dentre os seus discípulos peregrinam na terra, outros, terminada esta vida, são purificados, enquanto outros são glorificados, vendo claramente o próprio Deus trino e uno, assim como é”.
“A união dos que estão na terra com os irmãos que descansam na paz de Cristo, de maneira alguma se interrompe; pelo contrário, segundo a fé perene da Igreja, vê-se fortalecida pela comunhão dos bens espirituais”(LG, 49).
Essa comunhão de bens espirituais, que é um verdadeiro intercâmbio de graças, é a riqueza da “Comunhão dos Santos”.

Diz a “Lumen Gentium” que:

“Pelo fato de os habitantes do Céu estarem unidos mais intimamente com Cristo, consolidam com mais firmeza na santidade toda a Igreja. Eles não deixam de interceder por nós junto do Pai, apresentando os méritos que alcançaram na terra pelo único mediador de Deus e dos homens, Jesus Cristo. Por conseguinte, pela fraterna solicitude deles, a nossa fraqueza recebe o mais valioso auxílio” (idem).

São Domingos, já moribundo dizia a seus irmãos:

“Não choreis! Ser-vos-ei mais útil após a minha morte e ajudar-vos-ei mais eficazmente do que durante a minha vida” (CIC, 956).

O mesmo dizia Santa Teresinha:

“Passarei meu céu fazendo bem na terra” (idem).
A Igreja acredita desde os primórdios na salutar “intercessão dos santos” e também na “comunhão com os falecidos”. E nos ensina que:
“A nossa oração por eles pode não somente ajudá-los, mas também tornar eficaz a sua intercessão por nós” (CIC, 958).
A primeira atestação da crença numa oração dos justos falecidos em favor dos vivos, a Igreja viu no segundo livro de Macabeus. Judas Macabeus, enfrentando o adversário Nicanor, que desejava destruir o Templo, na época da perseguição do terrível Antíoco Epífanes (166-160) a.C., colocando toda a sua confiança em Deus, teve um sonho, uma espécie de visão:
“Ora, assim foi o espetáculo que lhe coube apreciar: Onias, que tinha sido sumo sacerdote, homem honesto e bom, modesto no trato e de caráter manso… estava com as mãos estendidas, intercedendo por toda a comunidade dos judeus. Apareceu da mesma forma, um homem notável pelos cabelos brancos e pela dignidade, sendo maravilhosa e majestosíssima a superioridade que o circundava. Tomando a palavra disse Onias: ‘Este é o amigo dos seus irmãos, aquele que muito reza pelo povo e por toda a cidade santa, Jeremias, o profeta de Deus’. Estendendo por sua vez a mão direita, Jeremias entregou a Judas uma espada de ouro, pronunciando essas palavras enquanto a entregava: ‘Recebe esta espada santa, presente de Deus, por meio da qual esmagarás os teus adversários'”(2 Mac15, 12-15).
Esta visão de Judas Macabeus, mostra o grande sumo sacerdote Onias e o profeta Jeremias, ambos, então, já falecidos, intercedendo pelo povo de Deus.

Encontramos na Bíblia, a passagem em que Deus manda a Abimeleque que peça orações a Abraão:

“Ele rogará por ti e tu viverás” (Gen 20,7-17).

Ainda sobre a intercessão dos santos por nós, a Igreja deixou claro no Concílio de Trento (1545-1563):

“Os santos que reinam agora com Cristo, oram a Deus pelos homens. É bom e proveitoso invocar-lhes suplicantemente e recorrer às suas orações e intercessão, para que nos obtenham os benefícios de Deus, por Nosso Senhor Jesus Cristo, único Salvador e Redentor nosso. São ímpios os que negam que se devam invocar os santos que já gozam da eterna felicidade no céu. Os que afirmam que eles não oram pelos homens, os que declaram que lhes pedir por cada um de nós em particular é idolatria, repugna à palavra de Deus e se opõe à honra de Jesus Cristo, único Mediador entre Deus e os homens” (Sessão 25).
Enfim, a Igreja é a “comunhão dos santos”.

Na profissão de fé solene – o Credo do Povo de Deus – disse Paulo VI:

“Cremos na comunhão de todos os fiéis de Cristo, dos que são peregrinos na terra, dos defuntos que estão terminando a sua purificação, dos bem-aventurados do céu, formando todos juntos uma só Igreja, e cremos que nesta comunhão o amor misericordioso de Deus e dos seus santos está sempre à escuta das nossas orações” (CPD, 30).
A Eucaristia que celebramos é a antecipação litúrgica da feliz eternidade no Céu. Esta alegria que não tem fim, sempre foi representada pela festa de Bodas, do Noivo (Jesus) com a Noiva (a Igreja). A Eucaristia é a antecipação da consumação da glória da Igreja. Diz o Catecismo que:
“À oferenda de Cristo unem-se não somente os membros que estão na terra, mas também os que já estão na glória do céu” (CIC, 1370).
O altar em torno do qual a Igreja celebra a Eucaristia, representa, ao mesmo tempo, dois mistérios: “o altar do sacrifício” e a “mesa do Senhor” (CIC nº 1383).
São João viu todo o esplendor da Igreja futura na visão do Apocalipse: a Cidade Santa, a Jerusalém celeste, a Noiva, a Esposa do Cordeiro, a filha de Sião:
“Vem, e mostrar-te-ei a noiva, a esposa do Cordeiro. Levou-me em espírito a um grande e alto monte e mostrou-me a Cidade Santa, Jerusalém, que descia do céu, de junto de Deus, revestida da glória de Deus” (Ap 21, 9-11).

Note que bela comparação:

“Assemelhava-se seu esplendor a uma pedra preciosa, tal como o jaspe cristalino. Tinha grande e alta muralha com doze portas, guardadas por doze anjos. Nas portas estavam gravados os nomes das doze tribos dos filhos de Israel… A muralha tinha doze fundamentos com os nomes dos doze Apóstolos do Cordeiro… O material da muralha era jaspe, e a cidade ouro puro, semelhante a puro cristal. Os alicerces da muralha da cidade eram ornados de toda espécie de pedras preciosas: o primeiro era jaspe,… Cada uma das doze portas era feita de uma só pérola e a avenida da cidade era de ouro, transparente como cristal” (Apc. 21, 11-21).
Este riquíssimo simbolismo tem grande significação em cada uma de suas palavras, e nos revela que esta cidade inimaginável na terra, só pode existir no céu; é a Igreja na sua glória consumada, onde cada um de nós é chamado a viver na comunhão de toda a família de Deus. Ele e o Cordeiro estão presentes, não haverá falta de nada… Vejamos como continua a descrição:
“Não vi nela, porém, templo algum, porque o Senhor é o seu templo, assim como o Cordeiro. A cidade não necessita de sol nem de lua para iluminar, porque a glória de Deus a ilumina, e a sua luz é o Cordeiro.
As nações andarão à sua luz, e os reis da terra levar-lhe-ão a sua opulência. As suas portas não fecharão diariamente, pois não haverá noite… Nela não entrará nada de profano nem ninguém que pratique abominações e mentiras, mas unicamente aqueles cujos nomes estão inscritos no livro da vida do Cordeiro” (Apc. 21. 22-27).

E continua a descrição da Cidade celeste:

“Não haverá aí nada execrável, mas nela estará o trono de Deus e do Cordeiro. Seus servos lhes prestarão um culto. Verão a sua face e o seu nome estará nas suas frontes. Já não haverá noite, nem se precisará da luz de lâmpada ou do sol, porque o Senhor Deus a iluminará, e hão de reinar pelos séculos dos séculos” (Ap 22, 1-5).

Esta longa narração mostra a vitória e a gloriosa consumação final da Igreja. E o Apocalipse termina com o Senhor dizendo:

“Felizes aqueles que lavam as suas vestes para ter direito à árvore da vida e poder entrar na cidade pelas portas”(22,14).
“O Espírito e a Esposa dizem: Vem! Possa aquele que ouve dizer também: Vem!… Aquele que atesta estas coisas diz: Sim! Eu venho depressa! Amém. Vem, Senhor Jesus!” (22, 17-21).
A glória futura da Igreja já está garantida, porque o seu Senhor já reina no céu, sentado à direita do Pai, aguardando o momento de consumar o seu Reino.
“Depois de falar com os discípulos, o Senhor Jesus foi levado ao céu, e sentou-se à direita de Deus” (Mc16,19).

São Paulo explica na Carta aos Efésios todo o esplendor de Cristo, “Cabeça da Igreja”, já glorificado no céu:

“Ele manifestou sua força em Cristo, quando o ressuscitou dos mortos e o fez sentar-se à sua direita nos céus, bem acima de toda autoridade, poder, potência, soberania ou qualquer título que se possa nomear não somente neste mundo, mas ainda no mundo futuro. Sim, Ele pôs tudo sob os seus pés e fez dele, que está acima de tudo, a cabeça da Igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que possui a plenitude universal” (Ef 1,20-22).
É preciso ter em mente que Jesus glorificado à direita do Pai, é o Verbo Encarnado, perfeitamente homem; assim, a humanidade, por Jesus, “já voltou ao paraíso”, que havia perdido pelo pecado. Desta forma São Paulo nos exorta a vivermos cientes de que a nossa vida “está escondida com Cristo em Deus”:
“Se portanto, ressuscitastes com Cristo, buscai as coisas lá do alto, onde Cristo está sentado à direita de Deus. Afeiçoai-vos às coisas lá de cima, e não às da terra. Porque estais mortos e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus. Quando Cristo, vossa vida, aparecer, então também vós aparecereis com Ele na glória” (Cl 3,1s).

São Leão Magno(?431) dizia que:

“Onde a Cabeça está, aí devem estar também os membros do corpo”.
A Igreja tem plena consciência de que a sua glória está assegurada no céu, já que a “Cabeça” já está “sentada à direita do Pai”. Na missa da festa da Ascensão do Senhor, rezamos:
“Ó Deus todo poderoso, a ascensão do vosso Filho já é nossa vitória. Fazei-nos exultar de alegria e fervorosa ação de graças, pois, membros de seu Corpo, somos chamados na esperança a participar da sua glória”.

É nesta esperança que vive a Igreja:

“No mundo tereis tribulações. Mas tende coragem! Eu venci o mundo!” (Jo16,33).
Sabemos, como nos ensina São Paulo na carta aos tessalonicenses, que a Igreja passará pela terrível “provação final”, que será também o momento de dar ao Senhor a prova maior do seu amor, e que será também a sua maior purificação. Após isto será consumada na sua glória. Então, “Deus será tudo em todos” (1Cor 15,28). Estará então restabelecida a “Família de Deus”, que no Paraíso foi dispersa pelo pecado. Novamente Deus viverá no “jardim” celeste com o homem (Gen 2,5-8), com toda a intimidade e comunhão desejadas desde o princípio. A harmonia que o pecado rompeu será restabelecida plenamente. É a imagem maravilhosa que o Profeta nos dá do Reino do Messias, onde só haverá paz:
“Então o lobo será hóspede do cordeiro, a pantera se deitará ao pé do cabrito, o touro e o leão comerão juntos, e um menino pequeno os conduzirá; a vaca e o urso se fraternizarão, suas crias repousarão juntas, e o leão comerá palha com o boi.
A criança de peito brincará junto a toca da víbora, e o menino desmamado meterá a mão na caverna da áspide.
Não se fará mal nem dano em todo o meu monte santo, porque a terra estará cheia da ciência do Senhor, assim como as águas recobrem o fundo do mar” (Is 11, 6-9).

Sobre a “última provação” que a Igreja deverá enfrentar, fala o Catecismo da Igreja:

“Antes do Advento de Cristo, a Igreja deve passar por uma provação final que abalará a fé de muitos crentes” (cf Lc 18,8; Mt 24,12). A perseguição que acompanha a peregrinação dela na terra (cf Lc 21,12; Jo 15,19-20) desvendará o “mistério da iniquidade” sob a forma de uma impostura religiosa que há de trazer aos homens uma solução aparente aos seus problemas, à custa da apostasia da verdade. A impostura religiosa suprema é a do Anticristo, isto é, a de um pseudomonadalismo em que o homem se glorifica a si mesmo em lugar de Deus e do seu Messias que veio na carne (cf 2Tes 2,4-12; 1 Ts 5,2-3; 2 Jo7; 1 Jo 2,18-22) (CIC, 675).
O Catecismo explica que a grande impostura religiosa anticrística será uma falsificação do Reino de Deus, a ser implantado na terra, pelo próprio homem, sem a necessidade de Deus. É o ateísmo sistemático – já denunciado no santo Concílio Vaticano II (GS 20,21) – que leva o homem a se rebelar “contra qualquer dependência de Deus”.
“Aqueles que professam tal ateísmo – disse o Concílio – sustentam que a liberdade consiste em o homem ser o seu próprio fim e o único artífice e demiurgo [criado] de sua própria história. E pretendem que esta posição não pode harmonizar-se com o reconhecimento do Senhor…” (GS, 20).
A Igreja sabe que só entrará na glória do Reino passando por uma “Paixão” semelhante a do seu Senhor. O Catecismo afirma que:
“O Reino não se realizará por um triunfo histórico da Igreja segundo um progresso ascendente, mas por uma vitória de Deus sobre o desencadeamento último do mal (cf Ap 20,7-10), que fará a sua Esposa descer do Céu (Ap 21,2-4).
Então, finalmente, “haverá um novo céu e uma nova terra” (Ap 21,1) e se realizará o que está escrito:
“Eis a tenda de Deus com os homens. Ele habitará com eles; eles serão o seu povo, e ele, Deus-com-eles, será o seu Deus. Ele enxugará toda a lágrima dos seus olhos, pois nunca mais haverá morte, nem luto, nem clamor, e nem dor haverá mais. Sim! As coisas antigas se foram! (Ap 21,3-4).

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