sábado, 16 de fevereiro de 2019

O país que condena cristãos em série por “blasfêmia”

[aleteia]

23 já foram condenados à morte e executados; 25 estão em julgamento; 224 já foram punidos por uma lei arbitrária e vastamente manipulável



O caso mais famoso é o de Asia Bibi. A mulher católica, esposa, mãe de cinco filhos, foi condenada a morrer enforcada porque bebeu água de um poço do seu próprio vilarejo, foi acusada por um grupo de mulheres muçulmanas de tê-la contaminado simplesmente por ser cristã, questionou a fé islâmica das suas acusadoras diante desse disparate e foi assim denunciada por “blasfêmia”.
Ela passou quase dez anos presa, os últimos dos quais numa cela fria e mal iluminada do corredor da morte, sem saber o dia nem a hora em que, a qualquer momento, poderia ser assassinada. Diante de uma repercussão inusual no exterior, fomentada com grande empenho por grupos cristãos que tiveram a coragem de não se calar, a Corte Suprema do país revogou no final do ano passado a sua condenação à morte. Mas ela teve de abandonar a própria nação, com a família, para não acabar assassinada pela horda de fanáticos que queriam vê-la executada de qualquer maneira.
Asia Bibi está longe, porém, de ser a única pessoa vitimada pela famigerada “lei antiblasfêmia” que vigora desde 1986 no Paquistão e que, desde então, já impôs o seu peso espantoso e aberrantemente injusto sobre as costas de nada menos que 224 cristãos. Os dados vêm de Cecil Shane Chaudhry, diretor executivo da Comissão Nacional de Justiça e Paz (NCJP) do Paquistão, entrevistado pela Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN, pela sigla em inglês adotada internacionalmente).
O processo de Asia Bibi chegou a uma resolução positiva, mas outros 23 cristãos foram executados sob a acusação genérica de “blasfêmia” entre 1990 e 2017. Ainda há 25 cristãos em julgamento, segundo estudo da NCJP apresentado à ACN.

A lei antiblasfêmia

Dois parágrafos (B e C) da Seção 295 do Código Penal paquistanês dão pé às amplas e subjetivas interpretações que constituem a assim chamada “lei antiblasfêmia”:
  • 295B: estipula prisão perpétua para quem profanar o Alcorão;
  • 295C: condena à morte quem é acusado de insultar o profeta Maomé.
A lei chega a ser usada até mesmo contra os próprios muçulmanos como respaldo jurídico para desavenças que nada têm a ver com religião.
Cecil Chaudhry observa:
“A lei antiblasfêmia é uma ferramenta poderosa que os fundamentalistas podem usar em detrimento das minorias. Muitas vezes, essa lei é mal utilizada como meio de vingança pessoal. E quando as acusações são feitas contra os cristãos, toda a comunidade sofre as consequências”.
Foi o caso, por exemplo, em março de 2013, no distrito cristão Joseph Colony, da cidade de Lahore, quando o jovem cristão Sawan Masih foi acusado insultar Maomé. Quem recorda é o pe. Emmanuel Yousaf, presidente da NCJP, em depoimento à ACN:
“No dia 9 de março, depois das orações da sexta-feira, uma multidão de 3.000 muçulmanos incendiou todo o distrito. Foram destruídas quase 300 casas e duas igrejas”.
Os 83 instigadores do ataque incendiário foram todos libertados, mas o jovem Sawan Masih foi condenado à morte em 2014 e ainda aguarda recurso. Seu advogado, Tahir Bashir, comenta:
“As audiências estão sendo constantemente adiadas. A última foi agendada para 28 de janeiro, mas o juiz não compareceu. Enfim, a nova data da corte está marcada para 27 de fevereiro”.

“Testemunhas” nem sequer estavam presentes

Assim como o caso de Asia Bibi, o de Sawan está repleto de irregularidades. As acusações contra ele foram feitas por um de seus amigos muçulmanos, Shahid Imran, após uma discussão entre eles. Só dois dias depois é que apareceram duas “testemunhas”, que, na realidade, nem sequer estavam presentes no momento em que Maomé teria sido, supostamente, insultado. O pe. Yousaf declarou à ACN:
“As acusações contra Sawan estão sendo instrumentalizadas. A verdadeira motivação por trás disso é uma tentativa de expulsar os cristãos do distrito da cidade, que se tornou muito popular porque fica perto das metalúrgicas”.
A esposa de Sawan, Sobia, está criando os três filhos sozinha.
“Eu não sei por que eles acusaram meu marido. Só sei que o homem que o denunciou era um amigo dele com quem ele tinha discutido. Sawan é inocente”.
Enquanto isso, no Ocidente, governos, meios de comunicação e principalmente as autoproclamadas “organizações de defesa dos direitos humanos” fingem que estes fatos não existem ou não são merecedores da sua seletiva “preocupação”.
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Com informações da Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN)

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