quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Entrevista coletiva do Papa Francisco no voo de regresso do Japão e Tailândia

Papa Francisco no avião papal


26 Nov. 19


AVIÃO PAPAL, (ACI).- No voo de regresso a Roma, depois de sua viagem apostólica a Tailândia e Japão, o Papa Francisco concedeu uma coletiva de imprensa, na qual abordou a pena de morte, o uso das armas atômicas, assim como o caso do Óbolo de São Pedro e os protestos na América Latina.
A seguir, o texto completo da coletiva de imprensa concedida pelo Santo Padre:
Papa Francisco: Foi uma viagem intensa e também com uma mudança de categoria, porque uma coisa era a Tailândia e outra coisa foi o Japão e não se pode avaliar as coisas com as mesmas categorias. As realidades são avaliadas segundo as categorias que vêm das mesmas realidades e são duas realidades completamente diferentes. Por isso requer trabalho duplo e agradeço a vocês por isso. E também os dias muito intensos. Acredito que o trabalho foi forte. Agradeço.  Senti-me próximo a vocês neste trabalho. Obrigado.
Matteo Bruni: Então, apoiando-nos, escutando as perguntas, será uma ocasião também para contar com mais profundidade esses dias.
Pe. Yamamoto, Makato (Catholic Shimbun – Japão): Boa noite, Santo Padre. Nós agradecemos ao senhor de coração por ter vindo de muito distante ao Japão. Sou sacerdote diocesano de Fukuoka, um lugar muito perto de Nagasaki e Hiroshima. Santo Padre, como se sentiu quando estava em Nagasaki e Hiroshima? Gostaria de perguntar uma coisa: A sociedade e a Igreja ocidental têm algo a aprender da sociedade e da Igreja oriental?
Papa Francisco: Começo pela última. Um dito me iluminou muito: lux ex oriente, ex occidente luxus. A luz vem do oriente; e o luxo e o consumismo vêm do ocidente. Há essa sabedoria oriental, que não é sabedoria somente de conhecimento, mas de tempos, de contemplação. Ajuda muito à nossa sociedade ocidental – sempre demasiadamente às pressas – aprender a contemplação, a deter-se e olhar as coisas também poeticamente. Sabe, pensando nisso – e esta é uma opinião pessoal – mas acredito que falta ao ocidente um pouco mais de poesia. Há coisas poéticas belíssimas, mas o oriente vai além, o oriente é capaz de olhar as coisas com olhos que vão além. gostaria de usar a palavra ‘transcendental’ porque alguns religiosos orientais não acenam à transcendência, mas a uma visão além do limite da imanência, sem porém dizer transcendência. Mais além. Por isso, uso poesia, que é gratuidade, é buscar também a própria perfeição no jejum, nas penitências e também na leitura da sabedoria dos sábios orientais. Acredito que para nós, os ocidentais, nos determos um pouco é dar tempo à sabedoria e nos fará bem. Esta cultura da pressa ou a cultura do deter-se um pouco, deter. Não sei se isso serve para iluminar a diferença, mas é isso o que necessitaríamos.
A primeira: Nagasaki e Hiroshima, ambas sofreram a bomba atômica e isso as assemelha, mas há uma diferença. Nagasaki não teve somente a bomba, mas também os cristãos. Nagasaki tem raízes cristãs, o cristianismo é antigo, havia perseguição aos cristãos em todo o Japão, mas em Nagasaki foi muito forte. O secretário da Nunciatura me presenteou um fac-símile em madeira onde está escrito o “wanted (procura-se) daquele tempo: ‘procuram-se cristãos! Se você encontrar um, o denuncie e será bem compensado, se encontrar um sacerdote, o denuncie e será bem compensado’. Uma coisa ao ir ao museu que toca é: foram séculos de perseguição. Este é um fenômeno cristão que relativiza, no bom sentido da palavra, a bomba atômica, porque são duas coisas: se alguém vai a Nagasaki sozinho, diz 'se alguém é cristão, a bomba atômica' e se fica ali. Se vai a Hiroshima, é apenas a bomba atômica, porque não há uma cidade cristã como Nagasaki. Por isso que eu quis ir às duas. Em ambas está o desastre atômico.
Hiroshima foi uma verdadeira catequese humana sobre a crueldade: a crueldade. E não pude ver o museu de Hiroshima, não houve tempo, porque foi um dia difícil, mas dizem que é terrível, terrível. E também as cartas dos chefes de Estado, dos generais, que explicavam como se pôde fazer um desastre tão grande. Para mim, foi uma experiência mais tocante do que a de Nagasaki. Nagasaki, a do martírio. Vi o museu do martírio, mas a de Hiroshima, muito tocante. Ali, recordei que o uso das armas nucleares é imoral. Isso deve ir para o Catecismo da Igreja Católica. E não só o uso, mas a posse, porque no ocidente a posse ou a loucura de qualquer governante (Eles nos mandam descansar, mas eu termino). A loucura de alguém pode destruir a humanidade. Pensemos naquele dito de Einstein: ‘A quarta guerra mundial será combatida com paus e pedras’. Está dada a resposta?
Kawarada, Shinichi (The Asahi Shimbun): Gostaria de fazer uma pergunta sobre as armas nucleares. Você indicou justamente que uma paz duradoura não é realizável sem desarme. O Japão é um país que goza da proteção militar dos Estados Unidos e também é um produtor de energia nuclear, algo que comporta um grave risco para o ambiente e para a humanidade, como ficou tragicamente demonstrado pelo incidente de Fukushima. Como o Japão pode contribuir para a realização da paz mundial? Deveriam fechar as centrais nucleares? Obrigado.
Papa Francisco: Volto a falar sobre a posse de indústrias nucleares. Sempre pode acontecer um incidente e vocês também o experimentaram com o ‘tríplice desastre’, que destruiu muito. O nuclear é o limite. Deixamos as armas, porque são destruição. Mas o uso do nuclear está muito no limite porque ainda não alcançamos uma segurança total.
Você poderia me dizer que também com a energia elétrica se pode provocar um desastre por uma insegurança, mas seria um pequeno desastre. O desastre de uma central nuclear será um grande desastre. E a segurança ainda não foi elaborada. Eu, mas esta é uma opinião pessoal, não usaria a energia nuclear enquanto não houver uma segurança total sobre seu uso, mas não sou especialista nisso e digo uma ideia: alguns dizem que é um risco para a custódia da criação e que a energia nuclear deve ser suspensa. Está em discussão.
Eu me detenho sobre a segurança. Não há segurança para garantir que não haja um desastre. Sim, um a cada dez anos no mundo, mas também, em seguida, sobre a criação, o desastre da potência nuclear sobre a criação, sobre a pessoa. Também houve o acidente na Ucrânia, de muitos anos.
Distingo da guerra, das armas, mas aqui digo que devemos pesquisar sobre a segurança, quer para evitar acidentes, quer para as consequências sobre o ambiente e sobre o ambiente creio que fomos além do limite. Na agricultura com os pesticidas, na criação de frangos, com os médicos que orientam as mães a não dar às crianças para comer aqueles frangos de criação porque são criados com os hormônios e fazem mal à saúde. Muitas doenças raras que hoje existem devido ao mau uso do ambiente. A custódia do ambiente é uma coisa que... ou se faz hoje ou nunca mais. Voltando à energia nuclear: construção, segurança e custódia da criação.
Elisabetta Zunica (47 Kyodo News - Japão): Bom dia, Santo Padre. Hakamada Awao é um japonês condenado à morte, à espera da revisão do processo. Estava presente na missa na Tóquio Dome, mas não teve como falar com o senhor. Poderia nos confirmar se estava programado ou não um breve encontro com o senhor? Por que o tema da pena de morte é muito discutido no Japão. Mais de um mês antes da reforma do Catecismo sobre este tema foram executadas treze condenações à morte. Em seus discursos não há uma referência a essa questão. Não quis se pronunciar nesta ocasião ou pôde conversar com o primeiro-ministro?
Papa Francisco: Sobre esse caso de pena de morte, eu fiquei sabendo depois, não sabia daquela pessoa. Sobre o primeiro-ministro: falei em geral sobre muitos problemas, condenações, processos eternos que jamais acabam, quer com a morte, quer sem ela. Mas falei de problemas gerais, que existem também em outros países: os cárceres superlotados, as pessoas que aguardam com uma prisão preventiva sem presunção de inocência.
Quinze dias atrás fiz um pronunciamento para o Simpósio Internacional de Direito Penal e falei seriamente sobre o tema das prisões, da precaução e depois da pena de morte que, claramente se disse que não é mora e não pode acontecer. Acredito que isso deve ser unido a uma consciência que se desenvolve cada vez mais. Por exemplo, alguns países não podem aboli-la por problemas políticos, mas fazem uma suspensão que é um modo de dar a prisão perpétua sem declará-la.
Mas o problema da condenação deve ser sempre para a reinserção. Uma condenação sem janelas de horizonte não é humana. Também para a prisão perpétua se deve pensar sobre como o condenado possa se reinserir, dentro ou fora, mas sempre o horizonte, a reinserção. Você me dirá: mas há condenados por um problema de loucura, doença, incorrigibilidade genética, digamos assim. Então é preciso buscar o modo a fim de que ao menos produza, que lhes dê espaço, que lhes façam se sentir pessoas.
Hoje, em muitas partes do mundo os cárceres estão superlotados, são depósitos de carne humana, que ao invés de crescer de modo salutar muitas vezes se corrompe. Devemos lutar contra a pena de morte lentamente, lentamente. Existem casos que me dão alegria porque há Estados ou países que dizem: nós paramos por aqui. falei com o governador de um Estado no ano passado e ele, antes de deixar o encargo, fez a suspensão quase definitiva: são passos de uma consciência humana. Mas alguns países ainda não conseguiram se incorporar nessa linha de humanidade, Não sei sim... obrigado.
Guenois, Jean-Marie (Le Figaro, França): O senhor disse que a verdadeira paz só pode ser uma paz desarmada, mas o que acontece com a legítima defesa, quando um país é atacado por outro? Nesse caso, existe a possibilidade de uma guerra justa? Falou-se de uma encíclica sobre a não violência. Essa encíclica ainda está em projeto?
Papa Francisco: Sim, o projeto há, mas a fará o próximo Papa, porque mal tenho tempo. Há projetos que estão na gaveta, esse sobre a paz está lá, por exemplo. Está lá amadurecendo, mas quando for o momento o farei.
No entanto, falo bastante. Por exemplo, o problema do bullyng com as crianças da escola: É um problema de violência! Falei precisamente sobre esse assunto aos jovens japoneses. É um problema que estamos tentado ajudar a resolver com muitos programas educacionais. É um problema de violência, e os problemas de violência devem ser enfrentados.
Entretanto, uma encíclica sobre a não violência ainda não a vejo amadurecida, certamente devo rezar muito e devo buscar o caminho.
Sobre a paz e as armas, há aquele dito romano: Si vis pacem para bellum. E aí ainda não estamos maduros. As organizações internacionais não se arriscam, as Nações Unidas não se arriscam. Fazem muitas mediações meritórias. Países como a Noruega, por exemplo, sempre disposto a mediar e a encontrar uma saída para evitar a guerra. Isso está sendo feito e me apraz, mas é pouco. Ainda é preciso fazer mais. Pense, sem ofender, no Conselho de Segurança da ONU: há um problema com as armas e todos estão de acordo para resolver esse problema para evitar um incidente bélico, todos votam sim, um com direito de veto vota não e tudo se bloqueia.
Escutei (não sei julgar), que talvez as Nações Unidas deveriam dar um passo avante renunciado no Conselho de Segurança ao direito de veto de algumas nações. Não sou um técnico nisso, mas escutei como uma possibilidade. Não sei o que dizer, mas estaria bem que todos tivessem o mesmo direito.
Mas, no equilíbrio mundial há temas que neste momento não se pode julgar. Porém, tudo aquilo que se pode fazer para deter a produção das armas e deter as guerras e avançar na negociação, também com a ajuda dos facilitadores e intermediadores, isso se deve fazer sempre, sempre. E dá resultados.
Alguns dizem pouco, mas comecemos com pouco e depois avancemos. O resultado da negociação é resolver problemas. Por exemplo, no caso da Ucrânia e Rússia, não se fala de armas, mas houve a negociação para a troca de prisioneiros. Isso é positivo: sempre é um passo para a paz.
Agora, há uma troca para pensar a planificação de um regime de governo na Donbass e estão discutindo sobre isso. Há pouco tempo, aconteceu uma coisa bela e feia. A feia é, devo dizer, a hipocrisia ‘armamentista’: países cristãos, ou ao menos de cultura cristã, países europeus que falam de paz e vivem das armas. Isso se chama hipocrisia.
É uma parábola evangélica, Jesus fala sobre isso no capítulo 23 de Mateus. Acabar com essa hipocrisia implica que uma nação tenha a coragem de dizer: ‘Eu não posso falar de paz, porque a minha economia lucra muito com a fabricação de armas’. São coisas que, sem insultar nem sujar esses países, mas falando como irmãos.
A fraternidade humana. Detenhamo-nos porque a coisa é feia. Em um ponto, agora não lembro bem, chegou um barco cheio de armas que deveria passar as armas a outra embarcação para ir para o Iêmen (todos sabemos o que acontece no Iêmen). Os trabalhadores do porto disseram ‘não’. Aqueles trabalhadores foram corajosos. O barco voltou para seu lugar de partida. É um caso, mas nos ensina como se deve seguir nessa direção. Hoje a paz é muito frágil. Mas não desanimemos.
Guenois, Jean-Marie: E a legítima defesa com as armas?
A hipótese da legítima defesa permanece sempre. Também é uma hipótese que se contempla na teologia moral, mas como último recurso, último recurso com as armas. A legítima defesa com a diplomacia, com as mediações... Último recurso: legítima defesa, mas sublinhando o último recurso. Estamos avançando em  progresso ético e me agrada colocar em questão essas coisas. Quer dizer que a humanidade avança no bem, não só no mal.
Caricato, Cristiana (TV2000, Itália): As pessoas leem nos jornais que a Santa Sé comprou imóveis que custaram milhões no centro de Londres e fica um pouco espantada com esse uso das finanças do Vaticano, em particular quando está envolvido o Óbolo de São Pedro. O senhor sabia dessas transações financeiras? O uso que está sendo feito do Óbolo de São Pedro está correto? O senhor disse várias vezes que não se deve ganhar dinheiro com dinheiro, com frequência denunciou o uso sem escrúpulo das finanças, mas depois vemos que essas operações também envolvem a Santa Sé. Isso escandaliza. Como o senhor vê este assunto?
Papa Francisco: Obrigado. Primeiramente, da boa administração normal chega a soma do Óbolo de São Pedro. O que eu faço, coloco na gaveta? Não, isso é má administração! Procuro fazer um investimento e quando preciso doar, quando se avaliam as necessidades de um ano, esse capital não se desvaloriza, se mantém ou cresce um pouco. Esta é uma boa administração. A administração da gaveta é má. Mas é preciso buscar uma boa administração, um bom investimento. Está claro?
Também um investimento... Entre nós dizemos ‘um investimento das viúvas’, como fazem as viúvas: dois aqui, três ali, cinco acolá. Se um cai, há outro... não se arruína. Sempre seguro e dentro da moral.
Se você faz um investimento do Óbolo de São Pedro em uma fábrica de armamentos, o Óbolo então não é Óbolo. Se você faz um investimento e durante anos não mexe no capital, então não funciona. O Óbolo deve ser gasto em um ano, um ano e meio, até que chegue a outra coleta que se faz mundialmente. Isso é boa administração: com segurança. E sim, também se pode comprar uma propriedade, alugá-la e depois vendê-la, mas com segurança, com todas as seguranças pelo bem das pessoas do Óbolo. Depois, aconteceu o que aconteceu, um escândalo e fizeram coisas que não pareciam limpas.
Mas a denúncia não veio de fora. Aquela reforma da metodologia econômica que começou com Bento XVI foi adiante e foi o Revisor das contas internas quem disse: ‘Aqui há algo ruim, aqui tem coisa que não funciona’ Veio até mim e eu lhe disse: ‘O senhor está seguro?’ ‘Sim. O que devo fazer?’ ‘Existe a justiça vaticana. Vai e faça a denúncia ao Promotor de Justiça’ E nisso fiquei contente porque se vê que a administração vaticana tem recursos para esclarecer as coisas ruins que acontecem dentro, como neste caso, que se não é o caso do imóvel de Londres, porque isso ainda não está claro, mas ali havia casos de corrupção.
O Promotor estudou o assunto, fez consultas e viu que havia um desequilíbrio no orçamento e depois, pediu-me permissão para fazer as investigações. E disse-lhe: ‘Isso está claro?’. ‘Sim, há uma suposta corrupção nestes casos e me disse que ele tinha que fazer as averiguações’. Eu assinei as autorizações. A investigação foi realizada em cinco escritórios e hoje, embora exista a suposição de inocência, existem capitais que não foram bem administrados, também com a corrupção.
Acredito que em menos de um mês terão início os interrogatórios das cinco pessoas que foram bloqueadas porque houve indícios de corrupção. Você poderá me dizer: então, esses cinco são corruptos? Não, a suposição de inocência é uma garantia para todos, um direito humano. Mas há corrupção, se vê. Com as investigações veremos se são culpados ou não. É uma coisa feia. Não é bonito que estas coisas aconteçam no Vaticano. Mas foi esclarecido pelos mecanismos internos que começam a funcionar e que o Papa Bento tinha começado a fazer. Por isso, eu agradeço a Deus, não agradeço a Deus porque há corrupção, mas porque o sistema de controle vaticano funciona bem.
Philip Pullella, (Reuters EUA): Há preocupação nas últimas semanas com aquilo que está acontecendo nas finanças do Vaticano. Na opinião de alguns, há uma guerra interna sobre quem deve controlar o dinheiro. A maior parte dos membros do Conselho de administração da AIF se demitiu. O grupo Egmont suspendeu o Vaticano das comunicações seguras depois da busca e apreensão de 1º de outubro. O diretor da AIF ainda está suspenso e ainda não há um revisor-geral. O que o senhor pode fazer ou dizer para garantir à comunidade financeira internacional e aos fiéis em geral que são chamados a contribuir ao Óbolo de São Pedro que o Vaticano não voltará a ser considerado um país do qual não se pode confiar, e que as reformas continuarão e que não se voltará aos hábitos do passado?
Papa Francisco: O Vaticano fez progressos em sua meditação. Por exemplo, o IOR hoje é aceito por todos os bancos e pode agir como os bancos italianos, normal, algo que um ano atrás não podia.
Houve progressos. Depois, sobre o grupo Egmont: é algo não oficial, internacional, é um grupo que pertence ao AIF. O controle internacional não depende do grupo Egmont. O grupo Egmont é um grupo privado, que tem seu peso. Monyeval fará a inspeção programada para os primeiros meses do próximo ano, será feita. O diretor da AIF foi suspenso porque havia suspeitas de má administração.
O presidente da AIF se esforçou com o grupo Egmont para recuperar a documentação. E isso a justiça não pode fazê-lo. Diante disto, fiz as consultas à magistratura, a um magistrado italiano importante: ‘Que devo fazer?’. A justiça, diante de uma acusação de corrupção, é soberana num país, ninguém pode interferir lá dentro, ninguém pode dizer ao grupo Egmont: ‘Vossos papéis estão aqui’. Não, devem ser estudados os documentos aquilo que parece uma má administração, no sentido de um controle mal feito. Foi a AIF que, parece, não controlou os delitos dos outros. O seu dever era controlar. Eu espero que se prove que não é assim, porque ainda há a presunção de inocência. Mas, no momento, o magistrado é soberano e deve estudar como as coisas aconteceram; do contrário, um país teria uma administração superior que lideraria a sua soberania.
O mandato do presidente da AIF concluía no dia 19. Eu o chamei alguns dias antes e ele não se deu conta de que o estava chamando, e anunciei que no dia 19 deixava o cargo. Já encontrei o sucessor, um magistrado de altíssimo nível jurídico e econômico, nacional e internacional, e na minha volta assumirá o cargo da presidência da AIF e assim continuará.
Seria um contrassenso que a Autoridade de controle fosse soberana acima do Estado. É uma coisa difícil de entender. Mas aquilo que prejudicou um pouco foi o grupo Egmont. É privado. Ajuda muito, mas não é a autoridade de controle de Moneyval. Moneyval estudará os números, estudará os procedimentos, estudará como agiu o promotor de justiça e como o juíz e os juízes determinaram a coisa.
 Eu sei que nesses dias começará, ou já começou, o interrogatório das cinco pessoas que foram suspensas. Não é fácil, mas não devemos ser ingênuos, não devemos ser escravos. Alguém me disse que com isso tocamos o grupo Egmont, as pessoas se assustam, fazemos um pouco de terrorismo... Vamos deixar isso de lado. Nós vamos avante com a lei, com Moneyval, com o novo presidente da AIF. E o diretor foi suspenso: espero que seja inocente, eu gostaria, porque é algo bom que uma pessoa seja inocente e não culpada, eu espero. Mas foi feito um pouco de barulho com este grupo que não queria que fossem tocados os documentos que pertenciam ao grupo.
Pullela, Philip: As pessoas podem estar tranquila? O que dizer para as pessoas?
Papa Francisco: É a primeira vez no Vaticano que o caso é destampado a partir de dentro, não de fora. De fora, muitas vezes. Mas nisso o Papa Bento foi sábio, começou um processo que amadureceu, amadureceu e agora existem as instituições... está funcionando o revisor... Realmente, não quero ofender o grupo Egmont, porque promove tanto bem e ajuda, mas neste caso a soberania pertence ao Estado, também a justiça é mais soberana que o poder executivo. Não é fácil de entender, mas lhes peço que entendam esta dificuldade.
Juchem, Roland (CIC, Alemanha): Santo Padre, no voo de Bangkok a Tóquio, enviou um telegrama a Carrie Lam (chefe executiva) de Hong Kong. O que o senhor acha da situação ali, com as manifestações e as eleições municipais? E quando podemos acompanhá-lo a Pequim?
Papa Francisco: Os telegramas são enviados a todos os Chefes de Estado, é uma coisa automática, são atos de saudação, e é também uma forma educada de pedir permissão para sobrevoar o seu território. Isto não significa nem condenação nem apoio, é uma coisa mecânica que todos os aviões fazem quando tecnicamente entram. Avisam: ‘estamos entrando’, e nós o fazemos com cortesia, saudamos. Isto não tem nenhum valor no sentido da sua pergunta, tem apenas valor de cortesia.
Sobre a outra coisa que me disse, o que penso. Mas não é só Hong Kong, pense no Chile, pense na França, na democrática França, um ano de coletes amarelos, pense na Nicarágua, pense em outros países latino-americanos, Brasil, que têm problemas e também qualquer país europeu. É uma coisa geral. O que faz a Santa Sé com isto? Apela ao diálogo, à paz. Mas não é só Hong Kong. São várias coisas que têm problemas que eu, neste momento, não sou capaz de avaliar. Eu respeito a paz e peço a paz para todos estes países que têm problemas. Também há problemas na Espanha, problemas assim. Convém relativizar as coisas e apelar ao diálogo, à paz, para que se resolvam os problemas.
Juchem, Roland: E Pequim...?
Papa Francisco: Eu gostaria de ir a Pequim, eu amo a China.
Alazraki, Valentina (Televisa, Espanha): Papa Francisco, a América Latina está em chamas. Vimos depois da Venezuela e do Chile imagens que não pensávamos ver depois de Pinochet. Vimos a situação na Bolívia, na Nicarágua ou em outros países: revoltas, violência nas ruas, mortes, feridos, igrejas até queimadas, violadas. Qual é a sua análise do que está ocorrendo nestes países? A Igreja e o senhor, pessoalmente, como Papa latino-americano, podem fazer algo? Estão fazendo alguma coisa?
Papa Francisco: Alguém me disse isto: é preciso fazer uma análise. “A situação hoje na América Latina se parece com a de 1974-1980”. Chile, Argentina, Uruguai, Brasil, Paraguai com (Alfredo) Strössner, e creio também Bolívia. Tinham a Operação Condor. Naquele momento se chamava, mas uma situação assim em chamas. Mas eu não sei se é um problema que se parece ao outro. Realmente, neste momento, eu não sou capaz de fazer a análise disso. É verdade que não existem precisamente declarações de paz. O que está ocorrendo no Chile assusta-me, porque o Chile está saindo de um problema de abusos que causou tanto sofrimento. E agora regressa a um problema deste tipo que não compreendemos bem. Mas está em chamas, como a senhora disse. Temos de procurar o diálogo e também a análise. Ainda não encontrei uma análise bem feita sobre a situação na América Latina. Também há governos fracos, muito fracos, que não conseguiram colocar ordem e paz. Por isso ocorre essa situação.
Alazraki, Valentina: Evo Morales pediu a sua mediação, por exemplo. Coisas concretas.
Papa Francisco: Sim, coisas concretas. A Venezuela pediu mediação e a Santa Sé sempre se mostrou disponível. Há uma boa relação, estamos lá presentes para ajudar quando é necessário. A Bolívia fez algo deste tipo, ainda não sei bem através de qual meio, mas também fez um pedido às Nações Unidas que enviaram seus delegados, também alguns países da União Europeia. Não sei se o Chile fez algum pedido de mediação internacional. O Brasil certamente não, mas ali também há problemas. É um pouco estranho. Mas não quero dizer uma palavra a mais porque não estou em capacidade porque não estudei bem, porque sinceramente, não compreendo bem o problema.
Mas aproveito a sua pergunta. Falaram pouco sobre a Tailândia e Tailândia é outra coisa, diferente do Japão, é outra cultura. Diferente. Uma cultura de transcendência, uma cultura também de beleza diferente da beleza do Japão: uma cultura, tanta pobreza e tanta riqueza espiritual. Mas há também um problema que faz mal aos nossos corações que nos faz pensar na Grécia e nos outros. A senhora é mestra neste problema da exploração. Estudou-o bem, e o seu livro fez tanto bem. Na Tailândia, algumas coisas na Tailândia são duras, são difíceis por isso.
Mas há a Tailândia do sul, e há também a bela Tailândia do norte, onde eu não pude ir, a Tailândia tribal, como existe a Índia do nordeste que é tribal que tem outra cultura. Recebi cerca de vinte pessoas daquela região, que são os primeiros batizados, que vieram a Roma. Uma cultura diferente, essa cultura tribal que na Índia se conhece bem, mas na Tailândia ainda não se conhece bem, ao norte, né? E Bangcoc, como vimos, é uma cidade forte, grande, muito moderna, mas tem problemas diferentes dos do Japão e tem riquezas diferentes das do Japão.
Sobre os problemas da exploração, eu quis sublinhá-lo. E agradeço a senhora pelo seu livro. Assim como gostaria também de agradecer o livro "verde" de Franca. Onde está Giansoldati? Ah, está aí. Duas mulheres que vem no voo e que fizeram um livro, cada uma, que abordam os problemas de hoje. O problema ecológico, o problema da destruição da mãe terra, do meio ambiente. E o problema da exploração humana que a senhora tocou. Podemos ver que as mulheres trabalham mais do que os homens e são capazes. Obrigado. Obrigado a vocês duas, por esta contribuição, obrigado. E ainda levo no coração a camisa de Rocio. Não a esqueço. E a todos vocês, obrigado. Obrigado por fazer as perguntas diretas, obrigado. Isso faz bem, sempre faz bem. Rezem por mim, bom almoço. Obrigado.

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