sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

Juventude, catolicismo e homossexualidade

[domtotal]
Por João Elton de Jesus*


Diálogo da Igreja com as pessoas homossexuais avançou nos últimos anos, não tanto em documentos, mas em ações e posicionamentos .



A condição juvenil está para além de uma conceituação estritamente psicológica, fisiológica ou etária. Juventude é uma categoria socialmente produzida e portanto, dinâmica: as formas de vivenciá-la, os sentidos que são atribuídos a ela, a posição e o tratamento dados aos jovens variam de acordo com os diferenciados contextos sociais, históricos e culturais.
Em meio a essa realidade os jovens também vivenciam a religião. Para a juventude, a experiência religiosa, além do aspecto sagrado/transcendental, também se apresenta como um espaço para constituição de identidade e sociabilidade. Observa-se muitas vezes que essa vivência, por ser também experimentação, não se prende a uma única espiritualidade ou denominação religiosa.  Por isso um mesmo jovem, por exemplo, pode frequentar a missa e cultos, trazer em seu corpo tatuagens com símbolos hindus, praticar ioga e reverenciar os orixás.
Por outro lado, verifica-se que nos últimos anos a religião vem perdendo o seu espaço como referência ética juvenil. A moral religiosa não desaparece, mas divide espaço com outros discursos advindos de um mundo globalizado e plural. Os jovens contemporâneos de uma maneira geral são menos dogmáticos e questionam mais as orientações e até mesmo os ritos religiosos, gerando muitas vezes conflitos internos dentro dos templos e igrejas.
Assim como no campo religioso, a temática da sexualidade também ganha nova roupagem e tessituras no mundo juvenil. O que antes era tabu, hoje passa a ser, ainda que com restrições, algo muito mais presente e vivenciado pelos jovens, tal como a temática da virgindade, da identidade de gênero e da homossexualidade.
A Igreja Católica, atenta a esse movimento, tem tratado o tema da sexualidade, incluindo a homossexualidade, em diversas publicações e pronunciamentos oficiais. No documento Persona Humana (1975), as relações homossexuais são condenadas como graves depravações e como uma consequência triste de uma rejeição de Deus. (§9). Em Carta aos Bispos da Igreja Católica sobre o atendimento pastoral das pessoas homossexuais (1986), afirma-se que a condição homossexual constitui uma tendência para um comportamento intrinsecamente mau do ponto de vista moral e que sua atividade impede a autorealização e a felicidade porque é contrária à sabedoria criadora de Deus (§7).
 No Catecismo da Igreja Católica (1992) os atos homossexuais são apresentados como intrinsecamente desordenados, contrários à lei natural, fecham o ato sexual ao dom da vida, não procedem de uma complementaridade afetiva e sexual verdadeira e “em caso algum podem ser aprovados. ” (§2357).  Já no Lexicon: termos ambíguos e discutidos sobre família, vida e questões éticas (2002), a homossexualidade é apresentada como um problema psíquico na organização da vida sexual da pessoa e a homofobia, um argumento de má fé e um produto da ansiedade da psicologia homossexual.
Embora tenha uma trajetória de falta de diálogo com as pessoas homossexuais e sua condição, nos últimos anos verifica-se um grande avanço da Igreja no sentido de aproximar-se dessa realidade fortemente vivenciada por jovens do mundo inteiro. Contudo, tal movimento não se dá tanto em documentos, mas em ações e posicionamentos tal como aqueles feitos pelos Padres José Antônio Trasferetti, em São Paulo e Luís Correia Lima, no Rio de Janeiro; em organizações como Diversidade Católica e, de uma forma mais performática e contundente, pela postura do próprio Papa Francisco, que tem surpreendido os fiéis devido a sua acolhida às pessoas LGBTs.
Em viagem de regresso da Jornada Mundial da Juventude em 2013, Francisco disse: “Se uma pessoa é gay e procura o Senhor e tem boa vontade, quem sou eu para a julgar?”. Tal afirmação teve grande repercussão da imprensa e mostrou um lado desconhecido da Igreja. Essa postura positiva se reafirmou quando o Pontífice recebeu um grupo de pessoas homossexuais e também um homem transexual em suas audiências no Vaticano, algo nunca acontecido nos dois milênios da história da Igreja.
Ainda que se tenha posicionado contra o “casamento gay”, Francisco afirmou em sua exortação apostólica Amoris Laetitia que independentemente da orientação sexual a pessoa deve ser respeitada na sua dignidade e acolhida com respeito (§250). Em 2016 chegou a pedir desculpas às pessoas homossexuais pelas ofensas realizadas pela Igreja. Em entrevista à revista jesuíta La Civiltà Cattolica, publicada em agosto de 2013, quando questionado pela realidade de tantos cristãos excluídos, inclusive os homossexuais, Francisco afirmou que proclamar o amor redentor de Deus é um dever prioritário, antes do dever moral e religioso.
A postura de Francisco e as iniciativas da chamada pastoral da diversidade, já realizada em diversos países, tem mostrado uma abertura da Igreja para a realidade das pessoas LGBTs e consequentemente para tantos jovens que vivem essa condição. Tal abertura tem sido vista positivamente pela comunidade não heteronormativa que passa a ver a Igreja com outros olhos. Muitos jovens homossexuais e transexuais têm buscado a Igreja, principalmente agentes de pastorais e sacerdotes que mostram abertura ao diálogo, o que demonstra que há espaço para todos e que todos são chamados a vivenciar a sua religiosidade com liberdade e acolhida.

Evidentemente há muito a ser feito, são anos de perseguição e discriminação injusta que ainda mancham a imagem da Igreja perante essas pessoas muitas vezes marginalizadas e esquecidas por aquela instituição que se denomina como “mãe”, contudo, uma luz se mostra na escuridão e certamente os jovens e as jovens homossexuais do futuro poderão ser acolhidos e acolhidas verdadeiramente como filhos amados e filhas amadas que são. 

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