Dra. Dolores Voltas convida a distinguir entre legalidade e ética
BARCELONA, terça-feira, 19 de julho de 2011 (ZENIT.org) – O novo Código Deontológico da Organização Médica Colegial (OMC) espanhola afirma que o médico deve informar as mulheres sobre seu direito a abortar.
“Está obrigado a informar suas pacientes acerca de todas as prestações as quais têm direito em matéria de procriação e gravidez”, indica o documento aprovado no sábado, 9 de julho, e apresentado no dia 12 à mídia.
“O médico que legitimamente optar pela objeção de consciência, à qual tem direito, não está eximido de informar a mulher sobre os direitos que o Estado lhe outorga nesta matéria”, acrescenta.
A aprovação do novo Código Deontológico, apresentado pela OMC como “a verdadeira constituição” para a profissão médica, suscitou diversas reações, ainda que vários médicos tenham coincidido em criticar a rápida aprovação do texto, que permitiu poucas consultas e emendas.
A Dra. Dolores Voltas, que foi porta-voz da OMC quando saiu a primeira lei de descriminalização do aborto e ganhou um processo para conseguir um código deontológico da profissão médica catalã mais respeitoso da vida humana em seu início, destacou algumas contradições do novo código.
“Preocupa-me muito que se considere não ético que um médico tente impedir a morte do feto, tentando dissuadir a mulher de abortar, dizendo-lhe que está diante de um ser humano, que deve pensar bem etc.”, declarou a ZENIT.
“Porque a prática do aborto jamais será uma conduta ética, ainda que possa ler legal – continuou. É como fazer um brinde à nova lei do aborto.”
“Se um médico não quiser dizer a uma mulher onde abortar e for sancionado, na prática isso é uma restrição ao direito de objetar – disse. Então, não fica claro que a objeção de consciência será respeitada.”
Segundo a OMC, o novo código “serve para confirmar o compromisso da profissão médica com a sociedade à qual presta seu serviço, incluindo o avanço dos conhecimentos científico-técnicos e o desenvolvimento de novos direitos e responsabilidades de médicos e pacientes”.
Entre as novidades do novo documento, que substitui o de 1999, o código indica que “não é admissível uma objeção de consciência coletiva ou institucional”. Neste sentido, Voltas afirma que “uma instituição tem que ter uma coerência com os critérios da sua fundação”.
“Estamos falando de instituições privadas – acrescentou. Que não se deixe que essas instituições mantenham estes princípios, fazendo uma objeção geral para todos os profissionais que trabalham nela, acho que é ir contra a liberdade.”
Incoerências
O novo código deontológico da profissão médica espanhola destaca que “da objeção de consciência não se pode derivar nenhum tipo de prejuízos ou vantagens para o médico que a invoca”.
No capítulo sobre a atenção médica no final da vida, indica que “o médico nunca provocará intencionalmente a morte de nenhum paciente, nem sequer em caso de petição expressa por parte deste”.
“A sedação na agonia é científica e eticamente correta somente quando existirem sintomas refratários aos recursos terapêuticos disponíveis e se dispuser do consentimento do paciente, implícito, explícito ou delegado”, sublinha o novo código.
No capítulo sobre a reprodução humana, o documento recorda que “o ser humano é um fim em si mesmo em todas as fases do ciclo biológico, da concepção até a morte”.
E indica que “o médico está obrigado, em qualquer uma de suas atuações, a proteger a dignidade e integridade das pessoas sob seus cuidados”.
“Dentro das obrigações que o médico tem em matéria de educação e prevenção sanitária, devem incluir a de criar uma consciência individual e coletiva sobre as vantagens que se derivam da procriação responsável e de práticas sexuais seguras quanto à transmissão de doenças”, continua.
O código indica, em outro artigo, que “não é ética a manipulação genética que não tiver uma finalidade terapêutica, bem como a manipulação sobre o embrião ou feto que não tiver uma clara finalidade diagnóstica ou terapêutica e que não redundar em um benefício para ele”.
Em contraste com realidades como o escasso nascimento de crianças com síndrome de Down, afirma que “não é eticamente aceitável realizar provas genéticas com finalidade eugênica”.
“O médico está ao serviço de preservar a vida a ele confiada, em qualquer dos seus estágios”, destaca outro artigo do novo código.
Ao ser divulgado o texto do novo código, a associação Profesionales por la Ética indicou que o mais preocupante é que o direito do médico objetor de consciência fica limitado porque ele é obrigado a informar a mulher sobre seu direito ao aborto.
Jaime Urcelay, presidente de Profesionales por la Ética, destaca como aspectos positivos do código: que se impede a prática da eutanásia e a assistência ao suicídio, ao afirmar que “o médico nunca provocará intencionalmente a morte de nenhum paciente, nem sequer no caso de petição expressa por parte deste”; reconhece-se que “o ser humano é um fim em si mesmo em todas as fases do ciclo biológico, da concepção até a morte”, ainda que depois realizem concessões ao aborto; proíbe-se expressamente a participação direta ou indireta em processos de clonagem humana. Não se poderão criar novos embriões com finalidade experimental nem manipular um embrião ou um feto se não for com finalidade diagnóstica e terapêutica e sempre que redunde em benefício para ele.
Medicina na defensiva
O vice-reitor da Universidade Internacional Menéndez Pelayo (UIMP), Ángel Pelayo, afirmou, nesta quarta-feira em Santander, que a introdução do consentimento informado no âmbito jurídico da medicina mudou completamente o modelo clássico de relação entre médicos e pacientes, gerando uma “prática da medicina na defensiva”.
Definiu o consentimento informado como “um mecanismo de intervenção do Direito no campo da medicina”.
Ainda que o vice-reitor tenha falado do consentimento informado como um avanço nos direitos do paciente, explicou as consequências negativas de uma “mudança de modelo”.
Assim, a obrigação de informar o paciente verazmente e em todo momento supôs uma “redistribuição dos riscos”, que agora são assumidos também pelo profissional médico. Isso, disse ele, produziu uma maior “protocolização da medicina”, que provocou, por sua vez, um “aumento da desconfiança” entre profissionais e pacientes.
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