19 Sep 2011
Enrique Lara
O leitor
deve ter notado que esta matéria, de caráter moral, é ilustrada na capa
da presente edição com um contraste entre duas gravuras. Por que
utilizar tal recurso, próprio ao plano estético e não ao moral? A razão é
simples: as duas meias-faces – a do Divino Redentor no Sudário de Turim
e a desfiguração dela na obra do pintor moderno Rouault – simbolizam
muito apropriadamente a adulteração da moral católica, única verdadeira,
pela disseminação da pseudo-moral moderna no mundo neopaganizado de
hoje. A explicação mais detalhada da pintura de Rouault encontra-se no
quadro da pp. 22-23.
Feita essa observação inicial, passemos ao tema do artigo, de grande atualidade.
Sempre
que alguém atinge uma certa idade, se tem bom senso, é natural que olhe
para trás e faça um balanço de sua vida sob o olhar de Deus.
O
mesmo acontece, com mais razão, com uma civilização. Chegamos ao fim de
um século, de um milênio, e compreende-se que se faça um levantamento
dos últimos 100 anos.
Para ter um ponto de referência dos fatos ocorridos, tomei a coleção Globo 2000,
publicada pelo diário carioca "O Globo", e analisei as notícias do
início do século XX. À medida que ia lendo, aumentava em meu espírito a
sensação de espanto. Sim, pois o que escandalizava, com razão, as
pessoas daqueles tempos, tornou-se natural e até corriqueiro em nossos
dias. Apresento a seguir, a título exemplificativo, algumas dessas
notícias:
Se
o Kaiser vivesse hoje, em rigor de lógica deveria proibir quase todas
as danças mais recentes. E não só para as tropas, mas para todos,
inclusive meninos e meninas de cinco anos de idade nas escolas!
1902 – Pelleas e Melisande,
a única ópera do compositor francês Claude Debussy, estreou com
escândalo. O Diretor do Conservatório de Paris, onde o músico havia
estudado, proibiu seus alunos de a assistirem.
Debussy
proibido! Todas as lojas de CD hoje vendem suas composições na seção de
músicas eruditas! Qualquer diretor de conservatório enfrentaria
problemas caso proibisse seus alunos de assistirem a um show de música rock, mesmo sendo as letras desta explicitamente satanistas...
1906 – Comentário de um crítico teatral sobre a peça Fantasmas, de Henrik Ibsen: "É um esgoto aberto, uma odiosa ferida sem ataduras, um ato sujo cometido em público". Qual a razão de linguagem tão violenta? “Henrik Ibsen trouxe a vida real para o palco”.
Imaginem o que diria tal crítico se assistisse a cenas da televisão
atual! Programas televisivos não só tratam em público todas as mazelas e
desgraças que podem acontecer na vida, mas apresentam como normais as
maiores aberrações!
1901 – “Auguste
Rodin chocou crítica e público com sua escultura de Vítor Hugo,
representando o romancista francês numa figura seminua, emergindo de uma
rocha bruta – imagem que, para muitos observadores, sugeria uma espécie
de deus pagão”.
Atualmente
ninguém se escandaliza diante de qualquer evocação do paganismo e de
suas manifestações. Pelo contrário, elas estão na moda. Hoje, uma
escultura com bom senso e que não seja uma obra “abstrata” é qualificada
por muitos como conservadora! Além do mais, tal escultura escandalizava
não o Brasil católico, mas a França, já muito descatolicizada na época,
e que adotara uma política abertamente anticlerical.
Outra
notícia refere-se à saída de Oscar Wilde da prisão. O dramaturgo inglês
estivera encarcerado devido à prática do homossexualismo. Aliás, as
notícias da época nem sequer usavam essa palavra. Utilizavam
eufemismos: "Preso por grave atentado ... moral". Hoje em dia
esse pecado contra a natureza é cada vez mais apresentado com
naturalidade. No Antigo Testamento, a prática de tal vício provocou a
ira divina, sendo as cidades de Sodoma e Gomorra destruídas pelo fogo
enviado por Deus (Gn 19, 24-26). Segundo o Catecismo Maior promulgado
por São Pio X, esse é um dos pecados que“bradam aos Céus e clamam a Deus por vingança”!
Pus
de lado a coleção de notícias do início do século e examinei uma série
de recortes de jornais de nossos dias, narrando casos considerados
corriqueiros, os quais, há 100 anos ou menos, teriam provavelmente
causado horror e revolta. O que pensariam as pessoas de 1910, se
tomassem conhecimento destas notícias?
· “Pensão para companheiro homossexual”. A Previdência vai pagar pensão para o companheiro homossexual do segurado que morreu (“Jornal da Tarde”, São Paulo, 9-6-2000);
· “Feira livre oferece fotos pornográficas [na Internet]”. Imagens podem ser encontradas em seções de bate-papo da rede internacional, abertas a qualquer pessoa (“Folha de S. Paulo, 31-1-1999);
· “Levar os namorados para dormir no quarto, uma questão que desafia os pais (liberais ou não)”. Deixar a filha dormir com o namorado no próprio quarto, ou vice-versa, era uma questão inconcebível até bem pouco tempo atrás. Mas hoje a prática é aceita entre muitas famílias urbanas de classe média (“Jornal do Brasil”, 28-5-2000).
Tais
notícias são apenas algumas amostras do que pode ser encontrado hoje ao
se abrir qualquer jornal. Vai longe a época em que a sanidade moral e
psicológica era a norma! Hoje o antinatural, o absurdo, o non sense é erigido como normal.
“Revolução Cultural” e “Revolução dos costumes”
O
insigne pensador católico explica a seguir que tais autores marxistas
consideram essa revolução -- preponderantemente psicológica e tendencial
– uma etapa indispensável para se chegar à mudança de mentalidade, o
que possibilitaria a implantação da utopia igualitária nas instituições e
nas leis. E que sem tal preparação a transformação revolucionária e as “mudanças de estruturas” seriam efêmeras.
Embora essa “Revolução Cultural” tenha
se configurado inteiramente a partir da rebelião da Sorbonne, em 1968,
vinha ela sendo gestada muitas décadas antes, mediante a brutal
modificação de costumes, perceptível já no início do século XX.
O tópico a seguir, de autoria de Zuenir Ventura, publicado em Globo 2000, é muito significativo nesse sentido, ressaltando a “Revolução dos Costumes” :
“E
se a revolução dos costumes tiver sido a verdadeira revolução deste
século? Não a soviética ou a chinesa, nem a cubana, nem a portuguesa,
muito menos a de 64, mas a que fez o homem e a mulher do século XX
mudarem seu estilo de vida e seu modo de estar no mundo, tendo ao fundo
o rock como trilha sonora? .... Com destaque especial para os
anos 60, essa revolução nem sempre silenciosa subverteu códigos,
derrubou preconceitos e tabus, legitimou ‘desvios’, rejeitou convicções
estabelecidas, transformou reivindicações em direito e lançou novas
convenções .... Esse processo de liberação se acelerou a partir da
segunda metade do século, quando caíram as últimas resistências de
pudicícia e pudor .... . É claro que tudo isso não aconteceu
isoladamente, mas estimulado ou causado pelas invenções da ciência e da
tecnologia em geral, especialmente a da comunicação. Com o poder de
entrar não só dentro das casas, como dentro de seus próprios moradores,
condicionando gostos, preferências e sensações, a mídia foi fundamental
na criação desse ser .... O corpo foi o espaço onde se travaram as
batalhas comportamentais mais significativas. Permissivo e hedonista, o
século XX desenvolveu como nunca seu culto” (2).
O
texto acima descreve a transformação dos costumes, mas não vai ao fundo
da questão. Não é possível ocorrer uma tão profunda mudança de costumes
sem a alteração dos princípios morais que sustentam tais costumes. Como
se deu essa mudança? Desapareceram assim, simplesmente, os princípios
morais? E isto em todos os países ao mesmo tempo?
Mais
ainda. Como foi possível povos católicos em sua maioria, sem querer
deixar de ser católicos, aceitarem tal mudança, que em última análise é
frontalmente contrária à moral católica? No Brasil, 75% da população se
diz católica. No início do século era bem mais de 90%.
Então
essa mutação só se explica devido à relativização dos princípios
perenes da moral católica por parte dessa grande maioria. No decorrer do
século, embora se declare católica, tal maioria deixou de seguir os
princípios da doutrina moral da Igreja em matérias importantes como
contracepção, divórcio, aborto, homossexualismo etc.
Um comentário:
Tudo isso é incentivado pelos padres apóstatas, relativistas, em pacto com o modernismo nas mais diversas nuances, uns dos responsaveis, por ex., pela ascensão do PT ao poder e do mantenimento da comunização do país, como os da Teologia da Libertação que são relativistas e pregam um cristianismo a criterio pessoal, como nas seitas protestestantes, de prateleira de supermercado, com mercadorias à escolha do cliente.
Logicamente o trabalho de descristianização é completado por cristãos leigos de igual mentalidade enfiados no esquema.
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