terça-feira, 20 de setembro de 2011

O inimaginável absurdo: o que ontem era pecado hoje é exaltado, Parte I


19 Sep 2011


Enrique Lara

O leitor deve ter notado que esta matéria, de caráter moral, é ilustrada na capa da presente edição com um contraste entre duas gravuras. Por que utilizar tal recurso, próprio ao plano estético e não ao moral? A razão é simples: as duas meias-faces – a do Divino Redentor no Sudário de Turim e a desfiguração dela na obra do pintor moderno Rouault – simbolizam muito apropriadamente a adulteração da moral católica, única verdadeira, pela disseminação da pseudo-moral moderna no mundo neopaganizado de hoje. A explicação mais detalhada da pintura de Rouault encontra-se no quadro da pp. 22-23.

Feita essa observação inicial, passemos ao tema do artigo, de grande atualidade.

Sempre que alguém atinge uma certa idade, se tem bom senso, é natural que olhe para trás e faça um balanço de sua vida sob o olhar de Deus.

O mesmo acontece, com mais razão, com uma civilização. Chegamos ao fim de um século, de um milênio, e compreende-se que se faça um levantamento dos últimos 100 anos.

Para ter um ponto de referência dos fatos ocorridos, tomei a coleção Globo 2000, publicada pelo diário carioca "O Globo", e analisei as notícias do início do século XX. À medida que ia lendo, aumentava em meu espírito a sensação de espanto. Sim, pois o que escandalizava, com razão, as pessoas daqueles tempos, tornou-se natural e até corriqueiro em nossos dias. Apresento a seguir, a título exemplificativo, algumas dessas notícias:


Kaiser Guilherme II da Alemanha: o que diria ele das danças mais recentes?
1913 – "Contra o tango: [O Kaiser Guilherme II, da Alemanha, pediu] ao Exército e .... Marinha que suas tropas não dançassem nem o tango nem o two-step, considerados obscenos".

Se o Kaiser vivesse hoje, em rigor de lógica deveria proibir quase todas as danças mais recentes. E não só para as tropas, mas para todos, inclusive meninos e meninas de cinco anos de idade nas escolas!

1902 – Pelleas e Melisande, a única ópera do compositor francês Claude Debussy, estreou com escândalo. O Diretor do Conservatório de Paris, onde o músico havia estudado, proibiu seus alunos de a assistirem.

Debussy proibido! Todas as lojas de CD hoje vendem suas composições na seção de músicas eruditas! Qualquer diretor de conservatório enfrentaria problemas caso proibisse seus alunos de assistirem a um show de música rock, mesmo sendo as letras desta explicitamente satanistas...

1906 – Comentário de um crítico teatral sobre a peça Fantasmas, de Henrik Ibsen: "É um esgoto aberto, uma odiosa ferida sem ataduras, um ato sujo cometido em público". Qual a razão de linguagem tão violenta? “Henrik Ibsen trouxe a vida real para o palco”. Imaginem o que diria tal crítico se assistisse a cenas da televisão atual! Programas televisivos não só tratam em público todas as mazelas e desgraças que podem acontecer na vida, mas apresentam como normais as maiores aberrações!

1901 – “Auguste Rodin chocou crítica e público com sua escultura de Vítor Hugo, representando o romancista francês numa figura seminua, emergindo de uma rocha bruta – imagem que, para muitos observadores, sugeria uma espécie de deus pagão”.

Atualmente ninguém se escandaliza diante de qualquer evocação do paganismo e de suas manifestações. Pelo contrário, elas estão na moda. Hoje, uma escultura com bom senso e que não seja uma obra “abstrata” é qualificada por muitos como conservadora! Além do mais, tal escultura escandalizava não o Brasil católico, mas a França, já muito descatolicizada na época, e que adotara uma política abertamente anticlerical.

Outra notícia refere-se à saída de Oscar Wilde da prisão. O dramaturgo inglês estivera encarcerado devido à prática do homossexualismo. Aliás, as notícias da época nem sequer usavam essa palavra. Utilizavam eufemismos: "Preso por grave atentado ... moral". Hoje em dia esse pecado contra a natureza é cada vez mais apresentado com naturalidade. No Antigo Testamento, a prática de tal vício provocou a ira divina, sendo as cidades de Sodoma e Gomorra destruídas pelo fogo enviado por Deus (Gn 19, 24-26). Segundo o Catecismo Maior promulgado por São Pio X, esse é um dos pecados que“bradam aos Céus e clamam a Deus por vingança”!

Pus de lado a coleção de notícias do início do século e examinei uma série de recortes de jornais de nossos dias, narrando casos considerados corriqueiros, os quais, há 100 anos ou menos, teriam provavelmente causado horror e revolta. O que pensariam as pessoas de 1910, se tomassem conhecimento destas notícias?

· “Pensão para companheiro homossexual”. A Previdência vai pagar pensão para o companheiro homossexual do segurado que morreu (“Jornal da Tarde”, São Paulo, 9-6-2000);

· “Feira livre oferece fotos pornográficas [na Internet]”. Imagens podem ser encontradas em seções de bate-papo da rede internacional, abertas a qualquer pessoa (“Folha de S. Paulo, 31-1-1999);

· “Levar os namorados para dormir no quarto, uma questão que desafia os pais (liberais ou não)”. Deixar a filha dormir com o namorado no próprio quarto, ou vice-versa, era uma questão inconcebível até bem pouco tempo atrás. Mas hoje a prática é aceita entre muitas famílias urbanas de classe média (“Jornal do Brasil”, 28-5-2000).

Tais notícias são apenas algumas amostras do que pode ser encontrado hoje ao se abrir qualquer jornal. Vai longe a época em que a sanidade moral e psicológica era a norma! Hoje o antinatural, o absurdo, o non sense é erigido como normal.

“Revolução Cultural” e “Revolução dos costumes”


Legend Figur - obras de arte que nao sejam de tipo "abstrato", como esta escultura, muitos hoje as consideram "conservadoras"
Em sua renomada obra Revolução e Contra-Revolução, o Prof. Plinio Corrêa de Oliveira aborda com penetração um tema intimamente conexo com a transformação acima apontada. Eis suas palavras: “Como uma modalidade de guerra psicológica revolucionária, a partir da rebelião estudantil da Sorbonne, em maio de 1968, numerosos autores socialistas e marxistas em geral passaram a reconhecer a necessidade de uma forma de revolução prévia às transformações políticas e sócio-econômicas, que operasse na vida cotidiana, nos costumes, nas mentalidades, nos modos de ser, de sentir e de viver. É a chamada ‘revolução cultural’” (1).

O insigne pensador católico explica a seguir que tais autores marxistas consideram essa revolução -- preponderantemente psicológica e tendencial – uma etapa indispensável para se chegar à mudança de mentalidade, o que possibilitaria a implantação da utopia igualitária nas instituições e nas leis. E que sem tal preparação a transformação revolucionária e as “mudanças de estruturas” seriam efêmeras.

Embora essa “Revolução Cultural” tenha se configurado inteiramente a partir da rebelião da Sorbonne, em 1968, vinha ela sendo gestada muitas décadas antes, mediante a brutal modificação de costumes, perceptível já no início do século XX.

O tópico a seguir, de autoria de Zuenir Ventura, publicado em Globo 2000, é muito significativo nesse sentido, ressaltando a “Revolução dos Costumes” :

“E se a revolução dos costumes tiver sido a verdadeira revolução deste século? Não a soviética ou a chinesa, nem a cubana, nem a portuguesa, muito menos a de 64, mas a que fez o homem e a mulher do século XX mudarem seu estilo de vida e seu modo de estar no mundo, tendo ao fundo o rock como trilha sonora? .... Com destaque especial para os anos 60, essa revolução nem sempre silenciosa subverteu códigos, derrubou preconceitos e tabus, legitimou ‘desvios’, rejeitou convicções estabelecidas, transformou reivindicações em direito e lançou novas convenções .... Esse processo de liberação se acelerou a partir da segunda metade do século, quando caíram as últimas resistências de pudicícia e pudor .... . É claro que tudo isso não aconteceu isoladamente, mas estimulado ou causado pelas invenções da ciência e da tecnologia em geral, especialmente a da comunicação. Com o poder de entrar não só dentro das casas, como dentro de seus próprios moradores, condicionando gostos, preferências e sensações, a mídia foi fundamental na criação desse ser .... O corpo foi o espaço onde se travaram as batalhas comportamentais mais significativas. Permissivo e hedonista, o século XX desenvolveu como nunca seu culto” (2).

O texto acima descreve a transformação dos costumes, mas não vai ao fundo da questão. Não é possível ocorrer uma tão profunda mudança de costumes sem a alteração dos princípios morais que sustentam tais costumes. Como se deu essa mudança? Desapareceram assim, simplesmente, os princípios morais? E isto em todos os países ao mesmo tempo?

Mais ainda. Como foi possível povos católicos em sua maioria, sem querer deixar de ser católicos, aceitarem tal mudança, que em última análise é frontalmente contrária à moral católica? No Brasil, 75% da população se diz católica. No início do século era bem mais de 90%.

Então essa mutação só se explica devido à relativização dos princípios perenes da moral católica por parte dessa grande maioria. No decorrer do século, embora se declare católica, tal maioria deixou de seguir os princípios da doutrina moral da Igreja em matérias importantes como contracepção, divórcio, aborto, homossexualismo etc.

Um comentário:

Wendell disse...

Tudo isso é incentivado pelos padres apóstatas, relativistas, em pacto com o modernismo nas mais diversas nuances, uns dos responsaveis, por ex., pela ascensão do PT ao poder e do mantenimento da comunização do país, como os da Teologia da Libertação que são relativistas e pregam um cristianismo a criterio pessoal, como nas seitas protestestantes, de prateleira de supermercado, com mercadorias à escolha do cliente.
Logicamente o trabalho de descristianização é completado por cristãos leigos de igual mentalidade enfiados no esquema.

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