quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Às vésperas da visita do papa Francisco, sobreviventes de abuso sexual se preparam

[bol]
Por Vivian Yee


Francisco provavelmente se encontrará de forma privada com as vítimas de abuso durante a visita, como fez o papa Bento 16 durante sua visita aos Estados Unidos em 2008
Francisco provavelmente se encontrará de forma privada com as vítimas de abuso durante a visita, como fez o papa Bento 16 durante sua visita aos Estados Unidos em 2008

Dan Ogrodowski permaneceu em silêncio até a meia-idade. Ele disse que esperava ir ao túmulo sem falar a respeito do padre de Milwaukee que o estuprou quando era criança.
Mas agora, amargurado pelo que considera a contínua traição da Igreja Católica Romana aos sobreviventes de abuso, ele está descrevendo publicamente seu tormento na infância pela primeira vez, na esperança de que o papa Francisco priorize as necessidades das vítimas e faça com que padres e bispos respondam por seus atos, durante sua primeira visita aos Estados Unidos neste mês.
"O papa Francisco disse palavras bonitas sobre reparações e chorou por nós", disse Ogrodowski. "Como ele pôde nos ver sendo agredidos por anos?"Francisco provavelmente se encontrará de forma privada com as vítimas de abuso durante a visita, como fez o papa Bento 16 durante sua visita aos Estados Unidos em 2008, segundo autoridades da Igreja. Mas Ogrodowski e muitos outros sobreviventes de abuso dizem que a Igreja ainda precisa cumprir sua promessa de reconciliação. Eles desejam que Francisco faça com que a Igreja pare de gastar milhões de dólares no combate aos processos de abuso sexual e de manter em sigilo os nomes de milhares de padres acusados, assim como os resultados de alguns casos disciplinares enviados ao Vaticano.
"Eu acho que o tempo de palavras nobres já passou", disse Barbara Blaine, presidente da Rede de Sobreviventes de Abusos por Padres, um grupo de defesa das vítimas que está planejando eventos em uma dúzia de cidades para acentuar a questão durante a visita do papa.Ela acrescentou: "Ele discursará sobre os problemas causados pelo homem que contribuem para o aquecimento global e a destruição da Terra. Mas e quanto aos problemas causados pelo homem de destruição da inocência e das vidas de tantos?"
Novos casos envolvendo padres na ativa são raros, mas ainda há indicações de uma luta contínua em torno da transparência. Semana passada marcou o início do julgamento federal de um padre da Pensilvânia, Joseph D. Maurizio, que é acusado de abusar sexualmente de meninos em um orfanato em Honduras, para o qual ele arrecadava dinheiro.As alegações de abuso foram relatadas à sua diocese quase cinco anos antes das autoridades da Igreja o afastarem em setembro de 2014, segundo os autos do processo.
Defensores e vítimas dizem que apesar da Igreja ter melhorado na prevenção de abusos, ela ainda resiste em uma prestação de contas plena. Ela bloqueia os esforços para reforma do estatuto de limitações que protege muitos padres de responderem criminalmente, e a Igreja de ser processada por maiores indenizações às vítimas, eles dizem. Fora dos Estados Unidos, a Igreja ainda não exige que aqueles que enfrentam acusações de abuso sejam removidos do ministério ativo. E o Vaticano nunca puniu explicitamente um bispo por proteger padres acusados, em vez disso aceitando discretamente algumas poucas renúncias.Francisco já adotou várias medidas claras para enfrentar o escândalo, criando uma comissão para prevenção do abuso sexual, que inclui sobreviventes de abuso, e sua intenção de nomear um tribunal no Vaticano para julgar os bispos acusados de proteger os padres acusados de abuso. Durante encontros com as vítimas, ele tem implorado pelo seu perdão.
Neste ano, ele também aceitou as renúncias de três bispos americanos –-um da diocese de Kansas City-Saint Joseph, no Missouri, e dois da Arquidiocese de Saint Paul e Minneapolis-– que foram criticados por não agirem contra padres pedófilos. 
Para Kenneth M. O'Renick, 72, que disse que tinha 6 anos quando um padre lhe ofereceu leite e biscoitos e o acariciou em sua escola paroquial em Kansas City, Missouri, a remoção dos bispos é prova da sinceridade de Francisco. "Este papa apenas começou, e espero e rezo para que ele viva tempo suficiente para continuar promovendo as mudanças que iniciou", ele disse.
Mas para alguns defensores, entretanto, a medida foi incompleta: Francisco poderia ter feito muito mais pela transparência ao simplesmente confirmar que os bispos foram removidos por causa de sua negligência nos casos de abuso, eles disseram.Ele também poderia ordenar às dioceses a divulgar os nomes dos padres americanos acusados de forma crível, ao menos 2.400 dos quais nunca foram identificados, disse Terence McKiernan, presidente da BishopAccountability.org, um grupo que documenta abuso sexual por clérigos.
"Uma reforma óbvia que Francisco poderia iniciar seria dizer às dioceses, 'Transparência significa ser realmente honesto a respeito do que aconteceu no passado'", disse McKiernan.Outra mudança poderosa, disseram defensores, seria estender ao restante do mundo a regra, adotada em 2002, que exige que os bispos americanos removam do ministério ativo os padres que enfrentam acusações críveis de abuso.
"O papa Francisco poderia dizer que se você já abusou de uma criança, você está fora", disse Joelle Casteix, uma vítima de abuso e antiga defensora das vítima que está publicando um livro sobre prevenção de abuso sexual. "Se você já encobriu um abuso sexual de criança, você está fora. E que todos informem às autoridades civis, sem ressalvas."Ogrodowski disse que a única ação ousada de Francisco seria permitir a cura que tantos necessitam, mesmo após tantos anos.

Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...